sexta-feira, 6 de março de 2015

“Accumulation by disposation” ---> Criação de uma classe empresarial angolana forte?! (1)

A ideia do Governo Angolano criar uma classe empresarial angolana forte é bastante apelativa mas precisa ser desmistificada. Neste post começamos a analisar como esta “classe empresarial forte” está sendo criada para então podermos ver se o resultado esperado poderá ou não ser alcançado.

Existe uma explicação na economia neoclássica para essa postura governamental. De uma maneira simplista pensa-se que dando acesso a fonte de renda a poucos esses poderão depois reinvestir tais rendas criando um efeito multiplicador na economia, i.e., mais oportunidade de emprego no sector formal, maior oferta de bens e serviços, colocando tais rendas nos bancos locais outros poderão beneficiar de credito com juros mais aceitáveis, enfim, como se pode imaginar podemos eventualmente ter uma melhoria na qualidade de vida da população em geral. Como Adam Smith escreveu na sua obra A Riqueza das Nações, “não é da benevolência do açougueiro, do fabricante de cerveja ou do padeiro que esperamos nosso jantar, mas da consideração que eles têm pelo seu próprio interesse”. Isto significa que tais agentes, beneficiários deste processo de criação de uma classe empresarial angolana forte, iriam satisfazer seus interesses e nesse processo dariam uma ajuda positiva na melhoria da qualidade de vida da população.

Em Angola, conforme explicamos no nosso post de 28 Outubro 2013, este processo de criação de uma classe empresarial angolana forte está a sendo feito essencialmente através do que Harvey (2005:116) chama de “accumulation by disposition” (acumulação por expropriação) Samir Amin chamou de “acumulação da acumulação primitiva do capital”, mas o habitual é hoje chamarmos de “ PRIVATIZAÇÃO”.
Existem algumas “armadilhas” neste método. Primeiro precisa-se garantir que os beneficiários sejam capazes de produzir o tal efeito multiplicador. E para o caso de Angola não temos bons exemplos. Alguns beneficiários deste processo usam tais rendimentos essencialmente para aquisição de bens de luxo, dentro mas maioritariamente fora do país. Isto é, contrariamente ao que deles se espera muitos não têm sido capazes de gerar a tão desejada riqueza (que poderia impulsionar ainda mais outros sectores da economia) e acima de tudo não foram capazes de criar mais empregos no sector formal da economia. Em suma, não foram capazes de tornarem produtivos os bens privatizados em seu favor, só assim se explica o facto de Angola ter sido em 2013 o ÚNICO país africano cujo investimento no estrangeiro foi superior ao volume de Investimento Directo Estrangeiro recebido conforme o nosso post de 28 de Setembro 2014.

Olhando para o exemplo recente da Coreia do Sul e Taiwan, que parece ser o modelo eleito, podemos afirmar que o processo de criação de uma classe empresarial nacional forte fez com que esses dois países se desenvolvessem num curto espaço de tempo. Contudo, tal processo passou pela identificação de uma classe por si só empreendedora, a partida, a quem foi dada exclusividade em certos sectores da economia. Vale questionar o que fez com que as coisas na Coreia do Sul, em Taiwan funcionassem e cá deixa-nos sérias dúvidas? A “velha” máxima de stick and carrots, i.e. pão e pau! Na Coreia do Sul e Taiwan o grupo restrito de beneficiários teve todo o apoio governamental sob uma simples condição a saber: Os que não tivessem o desempenho esperado lhes era retirado o privilégio. Pergunta: Será o governo em Angola capaz de assim proceder? A história do processo de privatização dos anos 90 nos mostrou que não!  

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