quinta-feira, 14 de julho de 2016

O Executivo Angolano e as suas Estratégias de Desenvolvimento (1): Até quando “errare humanun est”?


Um problema que podemos identificar nos vários documentos disponíveis onde o Executivo apresenta a sua estratégia de desenvolvimento de curto a médio prazo (o Plano de Desenvolvimento Nacional 2013-2017) e mais recentemente as “Linhas Mestras para a Definição de uma Estratégia para a Saída da Crise Derivada da Queda do Preço do Petróleo no Mercado Internacional” bem como a estratégia de longo prazo “Angola 2025” é a incapacidade de se compreender que num processo de desenvolvimento não é possível investir e desenvolver simultaneamente vários clusters.
Olhando para a experiência de desenvolvimento de outros países, como a Singapura, Coreia do Sul, China, podemos perceber que a estratégia não foi desenvolver simultaneamente vários sectores, mas focalizar-se naqueles que poderiam rapidamente gerar empregos, garantir divisas através da exportação de bens e serviços, assegurar receitas e possibilitar mais interligações (linkages) com outros sectores da economia. Um caso interessante e que podemos mencionar é o facto da Coreia do Sul ter apostado na construção naval, por ter identificado enorme potencialidades a longo prazo, o que veio a materializar-se. Hoje este país é uma referência se não mesmo um dos maiores construtores de plataformas petrolíferas (os Kizombas no Bloco 15 do offshore angolano operado pela ESSO – Angola, foram todos construídos lá).
Para o caso angolano é evidente a falta de uma certa capacidade dos nossos experts priorizarem os clusters a desenvolver e como resultado verificamos que durante o período de bonança, quando os recursos provenientes do petróleo (em alta) estavam disponíveis, recursos foram alocados simultaneamente a vários clusters. Isso fez com que por exemplo, os pólos de desenvolvimento industrial, o projecto cartão-de-visita do sector industrial, não tivessem o desempenho esperado no que toca a criação de emprego e contribuição para o PIB, com base no Programa de Desenvolvimento do Sector elaborado para o período de 2009 – 2013. Afinal os investimentos no sector da energia e água deveriam preceder tal iniciativa.
Por outro lado, ao apostar correctamente no sector da construção com focos na (re)construção de infra-estrutura básica, o Executivo devido a factores políticos perdeu uma boa oportunidade de criar interligações com outros sectores, exemplo da produção de materiais e equipamentos para o sector em causa. Mas uma vez que Angola continua a precisar de melhorar as suas infra-estruturas, o Executivo tem agora uma sublima oportunidade de corrigir e desta fazer com que as futuras infra-estruturas publicas deixem um efeito duradoiro, impulsionando outros sectores da económica via linkages ou interligações sectoriais.
Enfim, urge compreendermos que num processo de alocação de recursos “dividir o mal pelas aldeias” acaba por ser contraproducente, pelo que, a solução passa pela discriminação sectorial[1] disponibilizando recursos a empreendedores capazes de superarem as metas de produção, receitas e empregos definidas antes de acederem aos recursos. Essa necessidade acaba por ser inalienável quando o Executivo apresenta na sua estratégia de saída da crise a vontade de utilizar fundos adquiridos via linha de crédito inicialmente para projectos públicos para promover o que indica como “projectos privados de elevada rendibilidade e promotores da diversificação da produção e das exportações”[2]. Isto só será possível se aos empreendedores seleccionados e a sociedade forem previamente comunicadas as metas de produção, receitas e empregos a gerar por cada um dos projectos beneficiados, o suporte disponível para que os projectos tenham sucesso bem como as cláusulas de penalização caso haja fracasso uma vez que estarão a utilizar fundos com garantia do Estado.


[1] Vale realçar que isso não significa que um dado sector será evitado completamente mas sim que deverá existir a necessidade de se identificar que sector/cluster desenvolver primeiro, segundo, etc, que sector o estado deverá proteger, que sector o estado devera incentivar a concorrência incluindo a de estrangeiros (preferencialmente em sectores mais maduros da economia). A preferência deve aqueles que possam assegurar as maiores interligações sectoriais.
[2] Governo de Angola ‘Linhas mestras para definição de uma estratégia para a saída da crise derivada da queda do preço do petróleo no mercado internacional’ (Jan. 2016, p. 15)

sexta-feira, 1 de julho de 2016

Os dólares, o BNA e a sua Nota de Imprensa semanal: Alocação de recursos em tempo de crise.

De um tempo a esta parte o BNA tem estado a divulgar nas suas Nota de Imprensa sobre Mercados Monetário e Cambial a forma como foram alocadas as divisas disponibilizadas no período em análise. Esta nova forma de proceder visa, no entender da instituição, dar uma maior transparência ao processo de acesso a divisas num período em que elas se tornaram escassas.

Por exemplo, na Nota de Imprensa referente ao período de 20 a 24 de Junho de 2016 indica-se que o sector agrícola recebeu 8,3 milhões de Euros e o sector industrial 64,1 milhões de Euros. No entanto ela acaba por pecar por defeito uma vez que não é possivel indentificar-se os reais beneficiários nem muito menos existe um follow up onde possamos apreciar o impacto desses recursos nos sectores priorizados quer seja em termos de volume, receitas ou ainda em termos de empregos gerados ou mantidos.

Muito recentemente, no nosso post de 19 de Fevereiro de 2016, indicamos que em tempos de crise “existe a real necessidade de se identificar e apostar em sectores (produtos e produtores) capazes de gerarem um efeito multiplicativo dos poucos recursos que lhes sejam disponibilizados”, gerando empregos, volumes que permitam a substituição das importações e receitas através da exportação. Cabe a uma instituição como o BNA, pensamos nós, fazer um pouco mais do que simplesmente regular o mercado. Espera-se que a sua intervenção ajude a capitalizar preferencialmente o sector produtivo (ver o post de 13 de Dezembro 2015) e dentro dele priorizar os produtos e produtores capazes de assegurarem o tão desejado efeito multiplicativo. Uma pauta aduaneira restritiva poderia assegurar a esses produtores um período de aprendizagem, rent seeking, e possibilidade de investimento em novas tecnologias e melhoramento do sistema produtivo. Contudo, aos beneficiados ser-lhes-ia dado metas claras de produção, emprego e receitas bem como uma componente de condicionalidade com cláusulas igualmente claras de penalização caso tais metas não fossem atingidas.

Sendo os recursos escassos, em tempo de crise é necessário discriminar e priorizar inicialmente aqueles que nos garantam os resultados desejados. Afinal nenhum país detém uma vantagem competitiva em todos os sectores. Há sectores em que o estado poderá participar, outros em que deverá priorizar a iniciativa privada nacional e estrangeira ainda outros em que parcerias público-privadas poderão ser a melhor opção.

Esperemos agora que os poucos recursos postos a disposição de alguns beneficiários ajudem a acelerar o processo de diversifição da economia e que venham a contribuir de uma maneira tangível para que surgem no país (via exportação de bens e serviços made in  Angola) outras fontes de divisas .