Ao lermos numa publicação que o actual Governador do Banco Central
(o BNA) parece ter pretensão de tornar o sistema financeiro em Angola em algo
capaz de financiar o consumo das famílias achamos tal proposição interessante
mas ao mesmo tempo preocupante, pelo que, neste post vamos tratar de analisar este tema.
É bem verdade que o consumo gera produção (interna ou externa
via importação). Para o caso de Angola, um país em transição da guerra para
paz, muito do consumo que se verificou no período pós-guerra foi satisfeito
essencialmente via importação o que num período de crise que se vive hoje devido
a queda do preço nos mercado internacionais da nossa principal commodity i.e. o petróleo, precisa ser
evitado se quisermos evitar problemas na balança de pagamentos. Pelo que lemos
nessa publicação o consumo seria dinamizado via crédito i.e. endividamento das
famílias. Vale aqui perguntar se essas mesmas famílias estariam depois em
condições de reembolsarem esse crédito.
A desvalorização da moeda necessária para impulsionar a produção
interna (e a consequente substituição das importações e possível expansão para
mercados externos via exportação) trouxe consigo um aumento da inflação e perca
do poder de compra da classe trabalhadora. Facilitar o acesso ao crédito para o
consumo nestas condições é, em nosso entender, via segura para uma crise
idêntica a do subprimeamericano.
De facto, para o caso de Angola, existem relatos de que o crédito mal parado parece ser já um problema para muitas
instituições financeiras no nosso mercado.
Analisando a história do desenvolvimento recente de países como
a Coreia do Sul e a China, notamos que nestes países, na sua primeira fase de
desenvolvimento, envidou-se esforços no sentido de se aumentar as poupanças, desencorajando o
consumo. Isso parece-nos bastante importante para o caso de Angola que vale
perguntar por que razão isso aconteceu?
A resposta simples foi que estes países deram conta que para financiarem o
sector productivo precisavam mobilizar recursos (externos através do
investimento directo e internos via poupanças). Existem relatos de que na
Coreia do Sul as pessoas eram encorajadas a não viajarem para o exterior do
país de férias por formas a ajudarem a poupar divisas que serviam depois para a
importação de inputs para o sector
productivo.
O caso da China, por ser mais recente, é muito mais evidente.
Neste momento verifica-se uma mudança de focos saindo da exportação (atenção virada
ao mercado externo) para um incentivo ao aumento
do consumo. Isso porque a China já percebeu que nesta que chamaríamos segunda fase do seu desenvolvimento
para poder continuar a crescer de forma sustentável e controlável não pode
depender das exportações (como acontecia até então) uma vez que isso deixava o
país vulnerável a choques externos, por exemplo: havendo uma redução na procura
em países como os EUA e na União Europeia os chineses sentiriam enormes
dificuldades de escoar a sua produção. Pensou-se que a África poderia ser um
mercado alternativo, mas a queda dos preços das commodities nos mercados internacionais mostrou claramente que não!
Tendo como focos o mercado interno e devido ao seu elevado índice populacional,
a China, através do consumo, poderá continuar a crescer. Notem que para que
essa transformação ser possível, teve que haver um aumento dos salários o que fez com que algumas indústrias se
deslocassem para outras partes do mundo (ver blog de 29 de Julho 2014).
Contrariamente ao caso chinês, Angola está numa fase primária do seu desenvolvimento. O
alto preço das commodities (com
particular realce do petróleo) nos mercados internacionais deu uma falsa ideia ao
Executivo de que tudo ia bem por cá, até o preço cair como caiu. Se tivermos em
conta o relatório do BNA sobre a situação creditícia em Angola (ver blog de 13 de Dezembro 2015) onde fica claro que o sector dos
serviços foi o que mais atenção recebeu, podemos compreender que o sector productivo em Angola ainda
carece de enormes investimentos.
Assim sendo, respondendo a pergunta do nosso título, pensamos
que para Angola, nesta fase do seu desenvolvimento, ao invés de ‘dinamizar a
economia do consumo’ dever-se-ia prestar atenção ao sector productivo
canalizando recursos (i.e. crédito) a ele. Um aumento na produção interna de
bens (e serviços) com focos na exportação ajudaria a manter equilibrada a
balança de pagamentos (uma vez que a produção interna necessita de inputs do exterior). Um sector
productivo robusto (e a exportar) permitiria pensar em aumentar o salário real o que proporcionaria as famílias o tão
desejado aumento do consumo, desta feita via salário ao invés de terem acesso facilitado
ao crédito mas com um salário real fraco.