No post de 14 de Julho 2016, tratamos de ilustrar como o
Executivo deveria assegurar as interligações sectoriais dos investimentos
públicos em Angola, por formas a garantir o que temos chamado neste blog de efeito multiplicativo. Na
reflexão de hoje vamos tratar de apresentar um exemplo concreto, olhando para o
caso do relançamento da indústria têxtil angolana.
Num artigo com o título “Indústria: Têxtil reabilitado”[1]
de 30 de Agosto de 2016 publicado numa das revistas editadas em Luanda encontramos
alguns dados interessantes sobre o processo de reabilitação da indústria têxtil
nacional. No artigo podemos ver, por exemplo, que esse processo de reabilitação
ficou orçado em 1.2 mil milhões de dólares e que foi financiado pelo Japão. A
agora Nova Textang em Luanda custou 235 milhões de dólares, a Satec no Dondo,
Kwanza Norte 480 milhões de dólares e por último a África Têxtil em Benguela
410 milhões de dólares norte-americanos. Notamos igualmente que pensou-se em
quase tudo, uma vez que fica-se a saber que cada fábrica irá servir um segmento
distinto do mercado evitando assim a concorrência entre si (o que talvez fosse
benéfico), que estas 3 fábricas vão satisfazer cerca de 70% da procura interna
e espera-se que 30% do total da sua capacidade produtiva seja direccionado para
a exportação (presumimos que 30% da procura interna será satisfeita ou por
outras fábricas ou via importação). Por último o artigo nos indica que existem
já contactos feitos a nível dos mercados internacionais de referência.
Contudo, demos conta que o que foi ‘esquecido’ foi a
matéria-prima para essas fábricas, o algodão, que terá que ser importado para o
primeiro ano de actividade, como nos indica o artigo, mas acreditamos que se
possa continuar a importar até que internamente se consiga satisfazer a demanda
anual, apresentada igualmente no artigo, de 20 mil toneladas ano.
A luz deste facto vale perguntar: Por que razão não se articulou o processo de reabilitação dessas fábricas
com o relançamento da produção local de algodão? Isto dito de outra forma, por que razão a agricultura não serviu de base para que a indústria fosse
verdadeiramente o factor decisivo? Sabe-se, através do artigo, que o
processo de reabilitação da África Têxtil em Benguela (a única que temos dados
no artigo) começou em 2012 e terminou em 2014. Podemos especular que se tivesse
havido uma melhor articulação sectorial, talvez, no momento do arranque dessas
unidades fabris Angola já teria alguma produção de algodão e quiçá pouparia
cambiais evitando a importação de algodão.
Neste blog já
argumentamos a necessidade de Angola ter uma política industrial selectiva (ver por exemplo os post de 1 de Março 2015 e de 19 de Fevereiro 2016). Mas hoje, a luz do que já foi acima
apresentado, acreditamos que Angola, seguindo o exemplo do que fizeram países
como a Singapura, Rwanda, Coreia do Sul, deveria ter uma estrutura que, como nos sugere o historiador económico
Alexander Gerschenkron, faça a mesma
função, que a estrutura denominada
Economic Development Board, tem feito/fez nesses países que foi de centralizar e coordenar todas as actividades de desenvolvimento evitando assim um
erro como o que agora se assiste na reabilitada indústria têxtil nacional.
Sabemos que existe um projecto de produção de algodão na região do Kwanza-Sul e
que muito recentemente houve uma mesa redonda que concluiu que Malanje reúne
condições para o cultivo de algodão. Isso parece remeter-nos a filosófica
questão do ‘ovo e a galinha, quem veio primeiro?’ Mas podemos dizer que para
este caso concreto as duas acções i.e. o processo de reabilitação e o
relançamento da cultura do algodão deveriam ocorrer em simultâneo.
Em jeito de conclusão pode-se dizer que para o caso da
reabilitação da indústria têxtil em Angola houve uma certa desarticulação
sectorial que poderia ter sido evitada, com ganhos rápidos para o país, caso
houvesse uma entidade que chama-se a si a função
de coordenar toda a actividade
de desenvolvimento assegurando a tão desejada interligação sectorial (a
indústria a receber matéria-prima da agricultura e outros a fornecerem serviços
como fertilizantes, equipamentos ao sector agrícola). Enfim, ter-se-ia criado
facilmente um circulo virtuoso que com esse encontro recente de Malanje, talvez
venha a se materializar. Colocado desta forma vale perguntar aos experts “até quando errare humanun est”?
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