domingo, 13 de dezembro de 2015

Por uma Política Industrial Selectiva (1): O caso do acesso ao crédito

Ao ler um estudo feito pelo Banco Nacional de Angola (BNA) em 2013 sobre a situação creditícia em Angola[1] chamou-me a atenção a seguinte constatação de que “ [o] crédito apresenta uma elevada concentração em Luanda e no sector privado, sendo os empréstimos ao sector dos serviços o maior consumidor de crédito”[2], pelo que, restaria saber se este sector está a gerar empregos sustentáveis, receita (através dos impostos) e potencial para exportação (gerando divisas).

Neste blog chamamos a atenção em várias ocasiões (ver por exemplo post de 1 de Março 2015, 10 de Julho 2014) para a necessidade de se apostar no sector produtivo nacional. O facto de o nosso banco central (no caso o BNA) ter identificado o sector de serviços como o maior beneficiário de crédito em Angola serve como a mais forte evidência da necessidade de termos de uma política industrial selectiva, i.e. intervir para direccionar recursos a um determinado sector em detrimento de outro (e dentro deste sector apoiar determinados empreendedores em detrimento de outros). Vale recordar que a dificuldade no acesso ao financiamento representa um dos maiores entraves identificado por empreendedores em Angola no que toca ao ambiente de negócios[3].

Esta constatação do BNA mostra-nos que deixar que o mercado regule por si só o processo de alocação de recursos (no caso crédito) num país em transição, como Angola, parece ter impossibilitado que o sector productivo, aquele capaz de gerar empregos sustentáveis em especial para a juventude, tivesse os recursos financeiros de que necessita para se reerguer e transformar a economia.

Muitos poderão argumentar que esse resultado se deve a denominada Dutch disease (doença holandesa, ver post de 1 de Janeiro 2015) onde as receitas minerais, no caso de Angola receitas essencialmente petrolíferas, fizeram com que a moeda se fortalecesse tornando mais barata as importações.

Contudo, se partirmos da perspectiva segundo a qual, a presença de uma política industrial selectiva poderia permitir ao estado intervir no processo de alocação de crédito, priorizando o sector productivo nacional ao invés do sector de serviços. Outras medidas poderiam igualmente ser tomadas por formas a tornar viável os projectos de investimento que fossem apresentados, isto é, adopção de uma política industrial selectiva poderia mostrar a quem de direito que tal intervenção (i.e. alocação de crédito) não poderia ser viável sem o complemento de outras medidas como exemplo a necessidade de desvalorizar a moeda para tornar mais oneroso o processo de importação do produto acabado.

Ainda dentro de uma política industrial selectiva e no âmbito do que temos estado a reflectir neste blog[4] teria acesso ao crédito, dentro do sector productivo, apenas aquelas indústrias que se mostrassem viável de a médio prazo tornarem-se competitivas a nível regional e global, com forte potencial de crescimento no que toca a criação de empregos (necessários para as economias em transição), receitas e volume para exportação. Dentro dessas indústrias com este potencial de crescimento, teriam acesso ao crédito (com condições vantajosasapenas os empreendedores que assumissem o compromisso de atingirem metas predefinidas (metas de emprego, receitas fiscais e volume de exportação). Teria que haver uma componente de condicionalidade com cláusulas claras de penalização caso tais metas não fossem atingidas.

Em resumo, neste post tentamos ilustrar como países em transição, como o caso de Angola, poderiam alocar melhor o crédito disponível para a economia através da adopção de uma política industrial selectiva que permitisse revitalizar os sectores com maior possibilidade de a médio prazo proporcionarem economia de escala, empregos sustentáveis, receitas e volume para exportação. De resto, o estudo do BNA por si só nos mostra que o mercado tem estado a alocar recursos, talvez, para o sector menos desejado para uma economia em transição.  

 




[1] BNA (2013) “Estudo Sobre a Potenciação de Crédito Na Economia Angola”
[2] Ênfase é nosso
[3] Ver World Economic Forum (2014) The Global Competitiveness Report 2014–2015 (tradução: Relatório da Competitividade Global de 2014-15), p. 108.
[4] Ver post de 8 de Novembro 2015 onde explicamos que não é viável dar suporte equitativo a todas as industrias, sectores e regiões ao mesmo tempo

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