Começamos por
notar que o problema parece já estar bem identificado i.e. os estudantes estão a levar muito tempo a elaborarem os seus trabalhos
de fim de curso. Agora, em nosso entender, cabe a cada instituição
identificar as causas deste problema. Visto desta forma consegue-se perceber
que o problema não está na realidade, i.e. dificuldade dos estudantes
terminarem o curso, mas no modelo escolhido que passa pela elaboração e defesa
de um trabalho de fim de curso.
Como é hoje operacionalizado o modelo?
Após conclusão
do seu programa curricular os estudantes são encorajados a apresentarem as suas
propostas de temas e identificarem potenciais orientadores. Actualmente o
processo é muito aleatório onde os estudantes acabam por ser os mais
penalizados. Muitos estudantes, por si só, não conseguem encontrar orientadores
e acabam por desistir. Outros tendo orientadores que desconhecem as melhores
práticas no processo de orientação de trabalho de fim de curso acabam por optar
por práticas menos correctas, como a corrupção, muito mais pelas exigências que
lhes são feitas e que em vários casos estão longe do que deveria ser exigido neste
tipo de trabalho. Um número bastante reduzido consegue concluir e defender os
seus trabalhos após um período normalmente superior a seis (6) meses[1].
Possíveis alternativas
No nosso sistema
de ensino a avaliação resume-se essencialmente na aplicação de testes
(avaliação parcelar 1 & 2), apesar de, por exemplo, o regime académico da
UAN prever outras formas de avaliação. Em alguns países os estudantes de graduação
têm como avaliação contínua a elaboração, de
forma individual, de trabalhos de pesquisa de menor dimensão (os chamados
ensaios) com prazos de submissão bem definidos, fazendo os estudantes apenas uma
prova na época de exames. O sucesso deste tipo de modelo, em nosso entender
(baseado na nossa experiência enquanto estudante nesse tipo de contexto), está
na disponibilidade de centros de documentação (i.e. bibliotecas, incluindo
virtuais) bem apetrechados (fruto de avultados investimentos de forma permanente[2]),
dispondo os estudantes (e docentes claro) de todas as condições para irem
desenvolvendo os seus ensaios ao longo da sua formação. Esta prática dá aos
estudantes a possibilidade de desenvolverem a sua escrita académica e o seu
pensamento crítico e criativo ao longo de toda a sua formação, habilidades tão necessárias
no momento de elaborar um trabalho científico de maior dimensão a nível de uma
formação avançada (mestrado e/ou doutoramento).
Para o caso de
Angola, a nossa experiência, primeiro enquanto estudante neste sistema e depois
como docente neste subsistema de ensino por mais de uma década, nos ensinou que
vamos precisar de algum tempo para atingirmos este estágio.
Pelo que, sugerimos que para o contexto angolano se solicitasse aos estudantes no final do 8º semestre (4º Ano) a apresentação de
uma proposta dos seus temas para o trabalho de fim de curso e indicassem[3] um
potencial orientador (alguém que pudesse orienta-los). A instituição caberia
identificar potenciais orientadores a todos os estudantes que não tivessem
identificado por si só um orientador. Como resultado deste exercício todos os estudantes que terminassem os
seus planos curriculares teriam necessariamente alguem para orienta-los no trabalho de fim de curso. Notem que para o
sucesso deste exercício seria imperioso que os docentes/orientadores tivessem
frequentado um curso de Agregação
Pedagógica onde, através do módulo Tutoria
de Teses, fossem expostos as melhores práticas no processo de
orientação de um trabalho de investigação.
No contexto
actual (i.e. ausência de uma biblioteca bem apetrechada) ao pensarmos retirar
aos nossos estudantes de licenciatura a possibilidade de elaborarem um trabalho de pesquisa
independente, acreditamos que estaríamos a debilitar a sua formação,
privando-lhes não só de uma oportunidade de desenvolverem a sua escrita
académica como também o seu pensamento crítico e criativo conforme nos sugere a
Declaração da UNESCO de 1998 no seu
artigo 5º (promoção do saber mediante a pesquisa na ciência, na arte e nas
ciências humanas e a divulgação dos seus resultados) bem como o artigo 9º
alínea b que passo a citar “As instituições de educação superior têm que educar
estudantes para que sejam cidadãs e cidadãos bem informados e profundamente
motivados, capazes de pensar criticamente e de analisar os problemas da
sociedade, de procurar soluções aos problemas da sociedade e de aceitar
responsabilidades sociais”.
É imperioso compreendermos
que o trabalho de fim de curso é ainda a melhor oportunidade que o estudante
universitário em Angola tem de alcançar este propósito bem como de preparar-se
para o desafio que representa uma formação avançada (a nível do mestrado e/ou
doutoramento) e de testar as suas reais capacidades de elaborar e executar um
projecto (do princípio até ao fim) habilidades tão necessárias hoje mais do que
nunca no mercado de trabalho. Afinal, quando o modelo não se ajusta a
realidade, ajustamos (ou trocamos) o modelo e não a realidade!
[1] Apesar
de não termos estatísticas oficiais estimamos com base na nossa participação
como júri nas defesas de alguns trabalhos de fim de curso.
[2] Note que neste tipo de contexto quando o
estudante ou o docente verifica que
um certo libro/jornal científico não está disponível na sua biblioteca e pela
relevância acredita ser útil, pode sugerir a compra do referido material o que
em muitas vezes acaba por acontecer.
[3] A nossa experiencia pessoal nos ensinou
que quando tivemos a possibilidade de propor um orientador a motivação para
realização do trabalho foi muito superior do que quando nos foi indicado um
orientador.
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