sexta-feira, 15 de fevereiro de 2019

Angola está numa encruzilhada!*


Apesar do discurso político em Angola apregoar um certo pragmatismo na definição de uma estratégia para o desenvolvimento do país, as acções práticas têm vindo a se revelar bastante enraizadas numa ideologia neoliberal, diga-se mesmo anistórica e irrealista[1], em que deseja-se para o Estado, numa economia em transição, um mero papel de ‘coordenador e regulador’ da actividade económica. Tal visão contrasta com o resultado obtido em outras realidades como, por ex., a de Singapura, país que ocupa o 3º lugar no Índice de Competitividade Global 2017 – 2018. Em Singapura 90% das terras do país são propriedade do Estado; 85% das casas são propriedade do Estado; e 22% do PIB é produzido por empresas públicas[2]! Este e outros exemplos, como nos explicam especialistas como Ha-Joo Chang, mostra que havendo disciplina e uma componente de condicionalidade com cláusulas explícitas de penalização para os gestores públicos em caso de incumprimento das metas definidas, as empresas públicas podem tornar-se tão rentáveis como qualquer projecto privado. Por que não em Angola?


As associações empresariais pedem que o Executivo regularize as suas dívidas junto dos seus filiados. Os industriais angolanos indicam a falta de matéria-prima, falta de água e energia eléctrica como os principais problemas. Pelo que, (1) regularizar a dívida e assegurar que a despesa pública, i.e. contratação de bens e serviços, contribua igualmente para redução das importações, devem merecer a atenção do Estado em 2019; (2) uma melhor rentabilização dos perímetros irrigados existentes em Angola poderia contribuir para produção local de matéria-prima e redução da importação de produtos alimentares; (3) dotar os pólos industriais, por ex.: de Viana e Catumbela, de infra-estruturas adequadas bem como facilitar a instalação de futuros investimentos na Zona Económica Especial (pensando já na exportação) poderiam permitir aos investidores produzirem com um custo mais competitivo. Sim, Angola está mesmo numa encruzilhada.

A ausência de acções pragmáticas visando a rápida industrialização de Angola é também agravada pela introdução de outros produtos primários, para além do petróleo e diamantes, como a banana, café, rochas ornamentais, madeira como solução para o problema da diversificação das exportações conforme preconizado pelo Executivo através do PRODESI. Adoptar uma postura semelhante a de países como a Etiópia[1], i.e., atrair investidores (nacionais e estrangeiros) interessados em tirar o maior proveito possível de programas como o AGOAAfrica Growth Opportunity Act dos E.U.A. e a possibilidade que a União Europeia dá aos países de rendimento baixo de exportarem com isenções para a zona Euro tudo excepto armas, isso antes de Angola ser adversamente graduada em 2021 pela ONU em país de rendimento médio ancorado no petróleo,  mostra-se necessário.

A solução requer uma missão, vontade política e exige disciplina uma sinergia entre o sector público e as associações empresariais nacionais envolvendo as instituições de ensino e pesquisa. Enfim, hoje mais do que nunca seria talvez conveniente resgatar algumas das velhas palavras de ordem como, disciplina e produção. Afinal, Angola está numa encruzilhada!

*Versão anterior publicada em:
Wanda, F. (2018) ‘Angola está numa encruzilhada! Expansão, Edição 504, 21 Dez. http://www.expansao.co.ao/artigo/107645/angola-esta-numa-encruzilhada-?seccao=7  

[1] Wanda, F. (2018) Fútila em Angola versus Adama na Etiópia: Um ineficiente Estado dificilmente leva o sector privado à prosperidade.Expansão, Edição 502, 7 Dez.

[1] Wanda, F. (2017) 'Solução da crise económica angolana? Disciplina, disciplina, disciplina!', Expansão, Edição 421, 12 Maio.
[2] Economista Ha-Joo Chang  numa entrevista no jornal El País, Jan. 2018.

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