sábado, 28 de outubro de 2017

Optimismo (in)justificado na mudança de Governador no Banco Nacional de Angola?

Ao lermos a notícia da exoneração do então Governador do BNA Valter Filipe (a seu pedido) não podemos deixar de notar um certo optimismo que a nomeação do antigo Governador José de Lima Massano terá trazido. Contudo, preferimos esperar para ver se esse optimismo vai se traduzir numa melhoria, por exemplo, da gestão das divisas colocando-as mais ao serviço do sector produtivo nacional e menos ao serviço da compra de activos no exterior. E é precisamente neste ponto que lembramos que durante a passagem de José de Lima Massano pelo BNA de 2010 à Janeiro de 2015 o stock de investimento de angolanos no exterior do país aumentou consideravelmente saindo de menos de 5.000 milhões em 2009 para mais de 20.000 milhões em 2014, ver imagem abaixo. Esse movimento ocorreu depois do Executivo ter solicitado ajuda do Fundo Monetário Internacional em 2009.























Por outro lado, tendo esse capital saído no primeiro ‘reinado’ de José de Lima Massano o seu regresso ao BNA pode sinalizar o desejo do actual Chefe do Executivo ver o retorno dos dividendos e/ou do capital ‘parqueado’ fora (i.e. sem estar aplicado de forma produtiva). Afinal, Massano enquanto Governador do BNA terá supervisionado essa saída de capital, pelo que, deverá melhor do que ninguém saber identificar os promotores e os destinos.

Enfim, num contexto em que as Reservas Internacionais quidas (RILs) estão num nível baixo[1], depois de terem atingido o pico mais alto em 2013 durante a primeira passagem de Massano pelo BNA, acreditamos que o momento aconselha prudência, pelo que, somente depois de vermos, por exemplo, mudança na gestão do processo de alocação de divisas ou o repatriamento dos dividendos desses investimentos feitos no exterior poderemos dizer que o clima de optimismo é justificado!





[1] Dados do jornal Expansão Edição 442 indicam que as RILs situaram-se a volta dos 15.6 mil milhões em Agosto (6 meses de importação) 

sexta-feira, 13 de outubro de 2017

Ainda sobre a alocação de divisas: Parece que o BNA não está a fazer o seu devido papel

Ao lermos hoje no jornal Expansão[1] que o BNA continua a ‘facilitar’ a saída de capital angolano para aquisição de “empresas, casas e títulos no estrangeiro” ao invés de, por exemplo, priorizar o sector produtivo na aquisição de equipamento e matéria-prima (quando necessária) num período em que o novo Executivo diz-se comprometido com o processo de diversificação da economia, recordamos do que já havíamos dito no nosso artigo[2] publicado no dia 28 de Abril neste mesmo jornal e onde assinalávamos que o grande desafio era saber se teria “o BNA e o seu Governador a capacidade de monitorizar e assegurar que as divisas disponibilizadas sejam canalizadas para o sector produtivo e não usadas na aquisição de propriedades e bens de luxo no exterior?” Pelo texto apresentado pelo Expansão ficamos hoje a saber que a resposta infelizmente é “Não!”

Enfim, é necessário que a as palavras estejam alinhadas com as acções i.e. não basta dizer que existe vontade de diversificar a economia angolana, é necessário traduzir essa vontade em actos concretos, que passa por uma mudança no processo de alocação de divisas.




[2] Fernandes Wanda (2017) 'Papel do BNA em tempo de crise - Convidado', Expansão, Edição 419 28 Abril.
                                                                                                                                                                         

domingo, 1 de outubro de 2017

Os desafios do próximo governo em Angola

Lemos no jornal Expansão, edição 440, que o próximo Governo poderá ser mais reduzido do que o cessante, passando dos actuais 33 para 28 ministérios, número que acabou por ser actualizado para 31 ministérios na edição 441. Apesar de saudarmos tal medida ainda assim pensamos ser excessivo o que demonstra a dificuldade que o Chefe do Executivo vai ter em tomar medidas que possam ser impopulares a nível da cúpula do MPLA. Manter a coesão e consequentemente a estabilidade no seio do partido dominante em Angola será seguramente um dos grandes desafios do novo presidente João Lourenço especialmente num contexto em que existe um outro líder a nível partidário. 

Independentemente das prioridades a estabelecer pela futura equipa económica o certo é que Angola precisa retomar o crescimento económico, desta feita de forma sustentável, uma vez que a economia vem abrandando desde 2014, quando o PIB foi de 4.8%, tendo atingindo 0.1% em 2016. Pelo que, pensamos que com vista a se assegurar uma certa estabilidade macroeconómica o Executivo, a nível do OGE, deverá manter as Despesas (D) inferiores as Receitas (R) ou no mínimo D = R. Este objectivo passaria por uma melhoraria da qualidade da despesa através, por exemplo, da aplicação cabal da Lei da Contratação Pública (Lei nº 20/10 de 7 de Setembro) o que poderia alavancar algumas das Micro, Pequenas e Médias Empresas, certificadas pelo INAPEM, que poderiam proporcionar à juventude oportunidades de emprego no sector formal da economia.

Mobilizar os recursos financeiros necessários para a desejada retomada do crescimento económico, num contexto em que a principal commodity de exportação de Angola está em crise nos mercados internacionais apresenta-se como um outro desafio importante. Sabemos que na sua entrevista a agência espanhola EFF, ver edição 437 do Expansão, o agora presidente João Lourenço mostrou uma preferência para o investimento directo estrangeiro (IDE) ao passo que neste espaço, edição 440 do Expansão, alertamos sobre o risco de uma total dependência no IDE e ilustramos a necessidade de se encorajar o repatriamento do capital de angolanos através, por exemplo, da protecção legal do direito de propriedade vital para captação de IDE

Para o processo de retoma da economia, existem muitos exemplos de países em outras regiões do mundo, por exemplo no Sudeste asiático podemos citar a Coreia do Sul e Taiwan, mas também temos, hoje, em África uma das economias que mais cresce no mundo i.e. a Etiópia. O que todos esses países têm em comum é que o caminho para o desenvolvimento sustentável começou com um aumento considerável da produtividade no sector agrícola. Num outro fórum[1] indicamos que Angola precisa produzir grande parte dos alimentos que consome. Hoje sabemos que não é sustentável continuar a gastar cerca de 314.914 milhões de Kwanzas (1.898 milhões de dólares americanos)[2] na importação de alimentos.

Existem investimentos em canais de irrigação bem como desagravou-se (via pauta aduaneira) a importação de maquinaria para o sector produtivo (que inclui a agricultura). Contudo, também sabemos que, por exemplo, muitas das terras irrigadas na zona da Quiminha ou mesmo do canal de irrigação do Kikuxi não estão a ter o uso esperado e como tal não estão a contribuir para auto-suficiência alimentar nos produtos mais importados[3], esse mal precisa ser corrigido. Um aumento de produtividade no sector agrícola pode fazer surgir a jusante o subsector da indústria de produção de equipamento e maquinaria agrícola e montante forneceria matéria-prima para a indústria alimentar satisfazendo assim a demanda intersectorial

É preciso fazer funcionar os dois primeiros pólos industriais do país Viana e Catumbela que contrariamente ao que se esperava registam muito pouca actividade industrial. Para o caso de Viana, em 2015, existiam 150 indústrias transformadoras num universo de 500 empresas, significa dizer que 70% dos espaços criados não estavam a ser usados para criar a dinâmica necessária para a transformação estrutural da nossa economia. A utilização correcta desses dois espaços poderia ajudar na redução do custo de produção e, eventualmente na busca de parcerias internacionais, através do IDE, com vista a dinamizar e diversificar as exportações, almejar captar, por exemplo, parte dos cerca de 80 milhões de empregos no sector da indústria transformadora que a China está a fazer deslocar para outros países[4].

Todas essas acções exigem uma melhor coordenação do desenvolvimento nacional, dados estatísticos fiáveis e atempados para facilitarem a definição de metas concretas da diversificação da produção nacional e tomada de decisões. A aposta em sectores intensivos em mão de obra como os acima indicados, agricultura e indústria transformadora, permitiria que o crescimento nesta nova fase gerasse empregos, para a juventude, bem como que os serviços e produtos feitos em Angola pudessem, através de um programa de melhoria contínua da qualidade, a nível interno aumentar o conteúdo local no sector petrolífero e nos projectos de obras públicas e por via da diplomacia económica, expandir-se para outros mercados.

Enfim, para que o novo Executivo possa fazer face aos desafios identificados, acreditamos que vai ser preciso adoptar um posicionamento mais pragmático e flexível. Duas qualidades que segundo as nossas pesquisas[5] estão na base do sucesso das economias emergentes.




[1] Wanda, F. (2017) “A Politica Cambial na Óptica do PR: O que ficou por ser dito? – Analise”, Novo Jornal (online) disponível online: http://www.novojornal.co.ao/artigo/77162/a-politica-cambial-na-optica-do-pr-o-que-ficou-por-ser-dito-analise?seccao=NJ_Eco
[2] Combinando a importação de produtos agrícolas e alimentares cf. Quadro 5 - Exportação e Importação por Grupo de Produtos, Anuário de Estatística de Comércio Externo-2016 do INE. 1 USD = 165.903 Kz, câmbio médio anual do BNA em 2016.  
[3] Com base nos dados do Conselho Nacional de Carregadores.
[4] Segundo Justin Lin, ex-Economista Chefe do Banco Mundial citado pela Bloomberg (22/07/2014).