Ao ouvirmos hoje, 13 de Outubro 2018, um programa sobre o
Ensino Superior na Rádio Mais Luanda não conseguimos deixar de ficar perplexos
quando um dos convidados indicou que ‘hoje em Angola fazer mestrado é moda’.
Apesar de concordarmos com parte do que foi dito, especialmente sobre a
qualidade do ensino, em nosso entender, considerar como ‘moda’ perde de vista o
facto de faltar em Angola uma melhor articulação entre o sistema de ensino e o
mercado de trabalho.
Havendo um programa/uma política de fomento do primeiro
emprego[1] e
de enquadramento dos recém-licenciados a nível do mercado de trabalho, abria-se
para estes uma segunda opção i.e. os estudantes recém-licenciados poderiam ter a
possibilidade de obterem uma experiência prática no mercado de trabalho. O
Estado poderia conceder incentivos, de vária índole, mas que preferencialmente
sejam atribuídos ex-post as empresas que estabeleçam parcerias com as instituições
do ensino superior públicas e/ou privadas. De contrário, os estudantes acabam
por apostar numa formação pós-graduada a nível essencialmente do mestrado e em
muitos casos do doutoramento.
Se olharmos para outros contextos, compreendemos que este
fenómeno não é específico/exclusivo de Angola. Hoje a nível da Europa, falamos
de Portugal, Espanha, Reino Unido, na ausência de oportunidade de inserção no mercado
de trabalho logo após a licenciatura, muitos estudantes optam igualmente para uma
formação pós-graduada, evitando assim o desemprego involuntário, bem como
assegurando que os novos conhecimentos e habilidades venham ajudar a manter os
seus níveis de empregabilidade.
Tradicionalmente a formação a nível do mestrado e
doutoramento está associada a docência no ensino superior. Hoje as circunstâncias
são outras. Para se ter acesso ao emprego em algumas especialidades e em muitas
organizações internacionais, por exemplo, nas organizações ligadas ao sistema
das Nações Unidas, é exigido a pessoa que se candidata uma formação superior à
Licenciatura, normalmente exigem como nível mínimo o mestrado. Esta é uma
realidade da qual Angola e os jovens angolanos não poderão fugir.
Se olharmos para o mercado de trabalho angolano podemos
dizer que, com base nas nossas pesquisas recentes[2], quando
se estava a executar o programa de reconstrução nacional, o Executivo angolano
não soube tirar o máximo do proveito deste exercício, para proporcionar acesso
ao mercado de trabalho e a corresponde experiência prática aos quadros técnicos
angolanos. Hoje, muitos dos poucos postos de trabalhos que estão a ser criados exigem
como qualificação mínima a Licenciatura.
A ausência de uma aposta séria no processo de
transformação estrutural impulsionado por uma política industrial que vise
aumentar a produtividade no sector agrícola e um plano de industrialização
sério, faz com que o Executivo em Angola não consiga disponibilizar mais postos
de trabalhos para os técnicos experientes e recém-formados e muito menos para
os Licenciados. Não é por acaso que num outro texto[3], indicamos
que apesar da contínua aposta na formação, a oferta de postos de trabalho em
Angola era cada vez mais reduzida. Como resultado, segundo Relatório Sobre Emprego publicado pelo INE em Setembro de 2017, Angola tem uma taxa de
desemprego de 20% entre a população com 15 – 64 anos, chegando aos 38% entre os
jovens dos 15 – 24 anos. Esta
realidade faz com que, ainda segundo o relatório do INE, 67% dos jovens desempregados desistam de procurar empregos.
Enfim, podemos dizer que optar por uma formação avançada
a nível do mestrado em Angola, pelas razões que acabamos de apresentar, e em
outros países pelas razões igualmente específicas de cada contexto, acaba por
ser uma estratégia que o jovem recém-licenciado e sem perspectiva de emprego
útil encontra para não ser absorvido pelo sector informal da economia. Mudar
este prisma passa necessariamente pela adopção de uma política industrial por
parte do Executivo, que vise dinamizar o processo de transformação estrutural
através da indústria transformadora.
[1] É importante realçar que a política do 1º emprego também
deve ser extensiva aos técnicos recém-formados.
[2] Wanda, F. (In press) “Business
and the State: A Verdade por Detrás da Industrialização de Angola no
Período Colonial e Lições para o Presente”.
Revista Socioeconomicus; Wanda,
F. and Oya, C. (2016) “Um Estudo sobre as Empresas Industriais e de Construção
e as Dinâmicas de Emprego em África”, Revista
Socioeconomicus Nº 3, Edição Especial,
Outubro 2016, p. 287-297.
[3] Wanda, F. (2018) ‘Quando a oferta não cria a sua própria
demanda’ Edição 476, 8 June. http://www.expansao.co.ao/artigo/96338/quando-a-oferta-nao-cria-a-sua-propria-demanda?seccao=7