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terça-feira, 1 de agosto de 2017

O novo canal fluvial, de 40 milhões de USD, entre Angola e Zâmbia vai ter retorno?

Lemos com algum cepticismo[1] que o novo canal fluvial entre Angola (Rivungo, Kuando-Kubango) e Zâmbia (Shangombo), cuja obra esteve avaliada em 40 milhões de USD, iria impulsionar o comércio transfronteiriço entre os dois países bem como estimular o turismo. Como já havíamos assinalado no post de 14 de Junho 2015, “a grande maioria dos países africanos são produtores de produtos primários i.e. matéria-prima” o que torna o comércio intra-africano exíguo. 

Para que o comércio fosse de facto impulsionado seria necessário saber se foi previamente feito um estudo sobre os produtos, para além do petróleo, que Angola poderia exportar de forma competitiva para a Zâmbia. Isso porque sabemos que a África do Sul (de certa forma também o Zimbabwe) não só tem empresas com operações neste país, exemplo a Shoprite e a SABMiller, como também exportou para Zâmbia em 2015 um volume avaliado em 2.67 mil milhões de USD[2]. Apesar da extensa fronteira terrestre Angola não figurava entre os cinco (5) maiores exportadores para Zâmbia em 2015 (lista2 liderada pela África do Sul, integrando ainda por ordem de importância a República Democrática do Congo, China, Ilhas Maurícias e o Quénia).

Ao consultarmos alguns colegas do outro lado da fronteira, ficamos a saber que o nosso cepticismo era partilhado pelos experts de lá que encaram esse projecto como mais um dos vários (como o Terminal Mineiro no Porto do Lobito) que, no entender dos mesmos, talvez não fossem prioritários. Visto desta forma, acreditamos ser chegado o momento de o Executivo angolano rever o seu modelo de avaliação dos investimentos públicos avultados em infra-estruturas que poderão levar muito tempo a darem retorno ou que com tempo revelar-se-ão inconvenientes. Do nosso lado, no que respeita ao canal, esperamos que a nossa previsão esteja errada para o bem de Angola.



[1] Novo Jornal Online publicado 29/06/2017
[2] Fonte: The Observatory of Economic Complexity http://atlas.media.mit.edu/en/profile/country/zmb/ (Acedido: 1 Agosto 2016).

domingo, 20 de novembro de 2016

Já era tempo! Sobre o “fim à obrigatoriedade [da dívida pública] não ultrapassar os 60% do PIB”

Finalmente deu para ver que apesar do que muito se fala, o Governo em Angola parece ter momentos de lucidez ou tem alguém que talvez esteja a ler e atento as várias contribuições que vão estando disponíveis sob várias formas.

No nosso post de 13 de Agosto de 2016, tratamos de ilustrar a razão pela qual acreditávamos que não havia razão para se ter um tecto máximo da dívida pública a 60% do PIB, que em nosso entender na altura, estava baseado numa pesquisa que havia sido questionada por uma outra[1].

Demos conta hoje que muito recentemente foi aprovada, pela Assembleia, uma lei que define apenas como ‘referência’ o anterior limite de 60% do PIB. Apesar de ser uma notícia interessante, uma vez que volta a dar uma certa flexibilidade ao Governo, vale igualmente chamar a atenção que apesar de termos verificado que “a teoria económica nos serve de muito pouco no que toca a um aconselhamento quanto ao nível ideal de endividamento público,”[2] voltamos aqui a relembrar aos nossos leitores que em caso de endividamento que os valores em causa não sejam canalizados para cobertura dos gastos correntes.

Uma dívida pública tem efeitos multiplicativos quando, por exemplo, os valores são direccionados para (1) a construção de infra-estruturas (exemplo: água e energia eléctrica) capazes de darem suporte ao sector manufactureiro e primário (agrário) pelas externalidades que esses dois sectores podem gerar, assegurando ao Estado o tão desejado fiscal space (i.e. amplitude fiscal que se traduz no aumento de contribuintes). (2) Para a construção de infra-estruturas ligadas a saúde, educação e transportes públicos capazes de subsidiarem a actividade empresarial privada[3].

Enfim, esperamos que essa flexibilidade adquirida sirva para promover sectores que contribuam para o melhoramento da qualidade de vida da geração vindoura, porque afinal serão eles a reembolsar essa dívida!



[1] Ver o post de 13 de Agosto de 2016
[2] Ver artigo de Jonathan D. Ostry, Prakash Loungani, e Davide Furceri publicado pela revista do FMI Finance & Development Junho 2016, para uma posição semelhante.
[3] Subsidiar a actividade empresarial privada’ significa que o Governo ao equipar com meios materiais e humanos os sectores da saúde e educação pública faz com que a população activa tenha acesso a esses serviços sem grandes custos o que reduz a pressão [a nível de salários e regalias sociais] no sector empresarial privado tendo estes mais capital para reinvestirem nas suas actividades adquirindo novas tecnologias. 

sábado, 13 de agosto de 2016

Sobre a necessidade de um tecto máximo da dívida pública em Angola: 60% do PIB faz a diferença?

Muito temos lido e ouvido sobre o aumento da dívida pública angolana e acima de tudo sobre a rigidez da lei angolana sobre o assunto. Neste post não vamos tratar de dizer se a lei está certa ou errada, se devemos ou não ‘violar’ a lei. Pelo contrário, vamos tratar de ver até que ponto essa definição do tecto máximo da dívida pública tem razão de ser. Não pretendemos esgotar o assunto com este post mas sim incentivar os nossos leitores a reflexão.

Em Angola a Lei nº 1/14 que define o regime jurídico de emissão e gestão da dívida pública directa e indirecta indica no seu artigo 3 alínea 3 que “[a] divida pública, interna e externa, de curto médio e longo prazo, não deve exceder 60% do Produto Interno Bruto”. Ok, mas por quê 60% e não 45% ou mesmo 80%?

Ensina-nos a sabedoria popular que ‘quem deve paga’! Desta forma manter a nossa dívida privada ou pública a um certo nível parece o mais sensato a fazer. Contudo e em nome da já aludida sensatez precisamos perceber a razão do tecto estabelecido. Para o caso do 60% do PIB, um caso mais sonante sobre este tecto de dívida pública é o chamado critério de Maastricht[1] que define este, como um dos cinco aspectos que os países devem cumprir para que possam aderir a união monetária europeia (a Zona Euro).

Olhando para a literatura, demos conta de um artigo (um paper) científico de 2010 que muito influenciou o debate sobre o tecto máximo da dívida pública, da autoria de Carmen Reinhart e Kenneth Rogoff com o título Growth in Time of Debt [tradução directa: Crescimento em tempo de dívida][2]. Reinhart & Rogoff sugerem neste paper que quando a dívida atinge 60% do PIB “growth declines by about two percent; for higher levels, growth rates are roughly cut in half” [tradução directa: verifica-se um declínio do crescimento de 2%; e para níveis acima [dos 60%], as taxas de crescimento são cortadas pela metade]. Apresentado desta forma fica de certa forma justificada a escolha do legislador nacional em definir 60% do PIB como o tecto máximo da dívida pública em Angola.  

Para além disso fica igualmente claro que por cá, quando a Lei nº 1/14 foi elaborada, os nossos experts devem ter lido este paper de 2010 e tido em consideração muitas das implicações derivadas dele, como é o caso das medidas de austeridade aplicadas em momentos de crise (podemos citar o caso europeu mais mediático da Grécia e Portugal mas também no contexto africano e não só tais medidas vêem sendo aplicadas).

Contudo no mundo académico, esse tipo de conclusão está sujeito a um escrutínio rigoroso. Em 2013, no artigo “Does High Public Debt Consistently Stifle Economic Growth? A Critique of Reinhart and Rogoff” em que se propuseram reanalisar os resultados apresentados por Reinhart & Rogoff (2010), Thomas Herndon, Michael Ash e Robert Pollin todos da Universidade de Massachusetts nos EUA, assinalam que após correcção das omissões encontradas no estudo de Reinhart & Rogoff, os países na amostra que tinham uma dívida pública de 90% do PIB apresentavam um crescimento de 2.2%, desmistificando a ideia de que acima dos 60% do PIB o crescimento caí dramaticamente conforme sugerido por Reinhart & Rogoff e imposto no contexto Europeu pelo critério de Maastricht.   

Mais recentemente num artigo publicado pela revista do FMI Finance & Development Junho 2016, Jonathan D. Ostry, Prakash Loungani, e Davide Furceri assinalam que a teoria económica nos serve de muito pouco no que toca a um aconselhamento quanto ao nível ideal de endividamento público. Do nosso lado, temos advogado neste blog para que em caso de endividamento que os valores em causa sejam canalizados para a construção de infra-estruturas (exemplo: água e energia eléctrica) capazes de darem suporte ao sector manufactureiro e primário (agrário) pelas externalidades que esses dois sectores podem gerar, assegurando ao Estado o tão desejado fiscal space (i.e. amplitude fiscal que se traduz no aumento de contribuintes). Para a construção de infra-estruturas ligadas a saúde, educação e transportes públicos capazes de subsidiarem a actividade empresarial privada. Enfim, que a dívida socializada nos traga prosperidade!



[1] http://glossary.reuters.com/?title=Maastricht_Criteria
[2] http://www.nber.org/papers/w15639

terça-feira, 1 de março de 2016

Alguém poderia dizer-nos quando é que o Executivo vai definir uma estratégia para saída da crise?

Ao lermos em vários jornais publicados na nossa capital o título do memorando elaborado pelo nosso Executivo que passamos a citar “Linhas Mestras para a Definição de uma Estratégia para a Saída da Crise Derivada da Queda do Preço do Petróleo no Mercado Internacional” demos conta de duas situações: (1) o título é realmente bastante longo, (2) o governo ainda não definiu uma estratégia para saída da crise!

Pelo título compreendesse que o memorando visa ajudar o Executivo a definir essa estratégia, o que não deixa de ser interessante porque mostra que os autores (sempre gostaríamos de pensar que foram várias cabeças a pensar e não uma só!) do documento aparentemente não querem assumir que o que propõe é a estratégia de facto que poderia ajudar-nos a sair dessa ‘senhora’ crise. Assim sendo, pensamos ser válido perguntar: Quando é que o Executivo vai definir uma estratégia para saída da crise?

Em períodos de crise, como disse e bem o Chefe do Executivo no discurso de abertura da 4ª Sessão da Terceira Legislatura da Assembleia Nacional que passamos a citar, “(…) se conseguem os feitos mais audaciosos e esse é o caminho do progresso.”

Assim sendo e com vista a dissipar qualquer dúvida seria importante que o Executivo assumisse (3) que o memorando é a estratégia ou (4) comunicasse a sociedade quando estará disponível a estratégia para que com os seus comentários (e/ou críticas) ajudar a quem compete gerir o processo. Optar pela indefinição não só contrária a citação acima referenciada como também não permite que sejam arregimentadas contribuições saudáveis a proposta feita.

A nossa crise advém não só mas essencialmente da falta de cambiais (i.e. moeda externa), resultante da baixa do preço do nosso principal produto de exportação, o petróleo. Assim sendo, a solução passa por criar condições para que se possa ter uma fonte alternativa de cambiais.

A um ano atrás, no nosso post de 1 de Março de 2015, apresentamos as 3 Regras do Desenvolvimento propostas por Kaldor (1967) que achamos pertinente voltar a citar:

Regra 1: Todos os países se desenvolvem e atingem altos níveis de rendimento per capita através[1] da industrialização.

Regra 2: Na etapa inicial as indústrias nascentes desenvolvem-se através de uma certa protecção.

Regra 3: Quem dizer o contrário estará mentindo.

A luz do que nos propõe Kaldor a via para saída da crise em Angola passa necessariamente pela industrialização. Neste blog já temos estado a analisar o esforço que o Executivo tem feito nesse sentido e a apresentar algumas pistas sobre o que se poderia melhorar (ver por exemplo os vários posts sobre os “Caminhos da Transformação Estrutural em Angola”, bem como os posts “Por uma Política Industrial Selectiva” ou ainda basta seguir as etiquetas (tags) industrialização, diversificação económica em Africa, economic diversification strategies). Felizmente existem disponíveis bons exemplos de países que implementaram processos de rápida industrialização que o Executivo em Angola poderia estudar e depois adoptar a melhor via.



[1] Nosso ênfase

domingo, 21 de fevereiro de 2016

Modelo de gestão da nova linha de crédito da China: Mais uma evidência da resiliência do Executivo?

Ao lermos num dos diários da nossa capital os anúncios de concursos públicos por previa qualificação referentes a projectos que serão financiados pela nova linha de crédito da China (LCC) ficamos impressionados pelas novas exigências que o Executivo através da Unidade Técnica de Negociação faz as empresas pré-qualificadas e que passamos a citar (1) necessidade de subcontratar empresas angolanas ‘para incorporação de conteúdo local no montante não inferior a 20%’, (2) ter a sua situação tributária bem como as (3) contribuições a segurança social regularizadas.  

A ideia de que o Executivo Angolano passou a tomar uma atitude mais acertada no relacionamento com a China não é nova (ver publicações de Lucy Corkin[1]) contudo, apesar dos pontos 2 e 3 acima apresentados serem de fácil comprovação ainda assim não se consegue saber de concreto o que se quer dizer por ‘incorporação de conteúdo local’. Afinal ela pode ser feita de várias formas: desde a contratação de mão-de-obra local até a aquisição de materiais de construção produzidos localmente.

Para se tirar o maior proveito e gerar efeitos multiplicativos desta LCC pensamos que o Executivo deveria dirigir esse processo priorizando a necessidade da aquisição de materiais de construção localmente produzidos, o que poderia ajudar a alavancar o sub-sector da indústria de produção de materiais de construção. Esse esforço poderia fazer com que no final das obras Angola tivesse uma indústria de produção de materiais de construção forte e com alguma capacidade produtiva de exportação para os países da região[2] e não só.

Priorizar a aquisição de materiais de construção localmente produzidos poderia também garantir o aumento da oferta de emprego para os jovens (muitos deles que hoje exigem um pouco mais do Executivo) bem como forçar as indústrias locais a investirem na expansão da sua capacidade produtiva (através da aquisição de novas máquinas e/ou a adopção de novas tecnologias de produção) afinal teriam demanda imediata para os seus produtos.

Dependendo da duração dos vários projectos o Executivos poderia canalizar recursos através, por exemplo, do programa Angola Investe[3]ou do BDA, para fomentar o surgimento de um outro sub-sector relacionado com a produção de matérias-primas para a indústria de produção de materiais de construção.

Apresentado desta forma fica claro que a incorporação de conteúdo local para esta LCC não pode ficar ao critério dos empreiteiros a seleccionar, sob pena de o Executivo repetir o erro cometido a quando das primeiras linhas de créditos que resultaram na construção das centralidades que tanto orgulham o Executivo mas que pouco efeito multiplicativo gerou. O Executivo Angolano tem com esta nova LCC a oportunidade de mostrar que aprendeu com os erros do passado e fazer com que em 2017 continue a ser (talvez) a opção certa!



[1] Corkin, Lucy (2011) “Strategic Partnership or Marriage of Convenience?” ANGOLA BRIEF January 2011 Volume 1 NO.1. http://www.cmi.no/publications/publication/?3938=china-and-angola-strategic-partnership-or-marriage [Last accessed 8 April 2013]; Corkin, L. (2012) “Angolan political elites’ management of Chinese credit lines” in Power, M. and Alves, A. C. (eds.) China and Angola: A Marriage of Convenience? Oxford: Pambazuka.
[2] Temos conhecimento que algum material de construção produzido localmente (no caso o cimento) tem sido já exportado para a Rep. Democrática do Congo por canais impróprios.

domingo, 8 de novembro de 2015

OGE 2016 e o Processo de Diversificação do Desenvolvimento Económico

Ao lermos o Relatório de Fundamentação da proposta de OGE para 2016 percebemos que um dos objectivos nacionais da Política de Promoção e Diversificação do Desenvolvimento Económico para o período de 2013-2017 passa pela promoção do “crescimento equilibrado dos vários sectores de actividade económica, centrado no crescimento económico e na expansão das oportunidades de emprego”. Essa pretensão chama a nossa atenção pelo facto de ser muito abrangente e como tal pouco provável de ser viável para o período indicado.

Se tivermos em mente que o foco principal da economia (neoclássica) é a alocação de recursos (que são escassos), fica difícil perceber por que razões os nossos experts decidiram fazer crescer de forma equilibrada vários sectores num período de 5 anos ao invés de concentrarem esforço e recursos em sectores que nesse mesmo período poderiam ajudar a tornar a nossa economia mais competitiva e menos dependente de um único recurso (i.e. petróleo).   

Nos posts anteriores (ver por exemplo 10 de Julho 2014, 14 de Fevereiro de 2015,) enfatizamos a necessidade de se prestar uma atenção especial aos sectores da indústria manufactureira e agrícola, por serem aqueles que nos poderiam segurar um rápido crescimento e oportunidades de emprego através do increasing returns”, isto é, economia de escala (ver essencialmente o post de 1 de Marco de 2015).

O gráfico abaixo analisa o valor percentual alocado, a nível do OGE, para estes dois sectores desde 2013:


Como se pode ver neste gráfico, estes dois sectores chave para os objectivos de diversificação da economia não têm merecido a devida atenção e como tal não nos deveria surpreender o facto de Angola ter dificuldades no que toca a criação de empregos em massa, e em especial para a juventude que por sinal constitui o grosso da população.

A história do desenvolvimento recente de muitos países, com especial enfase aos asiáticos, nos mostra que lá o esforço não foi no sentido de garantir o crescimento equilibrado dos vários sectores[1], mas sim prestou-se uma especial atenção a sectores que pudessem assegurar a partida (1) uma economia de escala, (2) ligações com outros sectores da economia, (3) empregos em massa, (4) exportações (consequentemente moeda externa) e (5) impostos. Será que não conseguimos compreender essas interligações?

Uma outra lição que se pode depreender do desenvolvimento ocorrido (em países como a Taiwan e Coreia do Sul) e que ainda ocorre (hoje em países como o Vietname, Camboja) foi o facto de estes países não só terem sabido identificar os sectores que geraram (e têm gerado) economia de escala, como também identificaram aqueles promotores/empreendedores que fossem capazes de garantir efeitos multiplicativos dos recursos postos a sua disposição. A estes beneficiários foi-lhes dado objectivos bem definidos e em caso de fracasso houve penalizações.

Falta-nos ainda dois (2) anos para que possamos avaliar que metas, definidas no Plano de Desenvolvimento Nacional, foram alcançadas. Contudo, sabe-se que o PIB de Angola tem estado a crescer abaixo dos 5% ano e sectores vitais não têm estado a merecer a devida atenção. Assim sendo, acreditamos que o executivo em Angola, precisa analisar o que acontece em outras partes do mundo e rapidamente aprender com os bons exemplos e ser mais pragmático se desejar evitar fracassos.   

 




[1] Nosso ênfase.

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Diversificação económica através do auto-emprego?

Apesar de termos já tratado, de certa forma, este tema no nosso post de 2 de Julho de 2015 somos obrigados a voltar a ele uma vez que o discurso político insiste em fazer uma colagem entre o fomento do auto-emprego e o processo de diversificação económica. Por outras palavras, para alguns dos nossos políticos, Angola também vai diversificar a economia através do auto-emprego, o que seria em nosso entender, uma acção apenas comparável ao que na cultura popular se denomina de reinvenção da roda! Afinal, até a data nenhum outro país diversificou a sua economia através do auto-emprego[1].

O que nos chama atenção neste tipo de posicionamento é a presença do que aparenta ser um certo desconhecimento do que se entende por diversificação da economia. Pois bem vamos explicar de uma forma simplista. A UNCTAD apresenta-nos a diversificação como a estrutura das trocas comerciais de um país comparada com a média mundial. Num índice de 0 a 1, quanto mais próximo do valor 1 a economia de um país estiver isso indica uma maior diferença com a média mundial. Para o caso de Angola, segundo os dados do UNCTAD[2] a economia angolana teve um índice de diversificação de 0.8 de 2002 a 2011 baixando ligeiramente em 2012. O Quénia por exemplo de 2002 a 2012 teve um índice de 0.7. A Coreia do Sul por outro lado e para o mesmo período teve um índice de 0.43 a 0.45. Como se pode perceber dos três exemplos apresentados, a Coreia do Sul tem uma economia mais diversificada.

Notem que a diversificação da economia de um país passa a ser uma necessidade inadiável por estar acoplada ao comércio mundial. Quanto menos diversificada for uma economia de um país (com um índice próximo do valor 1), menos opções a nível do comércio mundial este país terá i.e. menos possibilidade de gerar divisas. Como se sabe os países adquirirem tecnologia, bens e serviços que não produzem através do comércio (mundial) logo, é correcto sugerir que o acesso a menos divisas, reduz a possibilidade desses países se desenvolverem.

Ao se fazer esta colagem i.e. auto-emprego à diversificação económica, está-se de facto a sugerir que por via do auto-emprego Angola vai aumentar as suas opções no comércio mundial, logo, poderá através de uma maior participação (no comércio mundial ) ter outras fontes de divisas (para além do petróleo e diamante). O auto-emprego pode contribuir para a redução da pobreza (dando aos intervenientes a possibilidade de gerarem rendimentos próprios), redução do desemprego (desde que não gera o que a literatura denomina por subemprego) mas sugerir que o auto-emprego contribui para o processo de diversificação económica traduz-se no que chamamos de falácia!



[1] Não devemos confundir com cooperativas i.e. associação autónoma de pessoas.
[2]Acedido pela última vez em 6 de Junho, 2013.

domingo, 2 de agosto de 2015

Mais uma razão para uma política industrial selectiva e articulada!

Através de um website de notícias de Angola ficamos a saber que o governo teve que suspender de forma provisória as restrições a importação que havia implementado em Janeiro deste ano.

Parece ter havido um pequeno equívoco por parte da autoridade competente, no que toca a protecção a produção nacional. Será que vamos proteger para produzir ou proteger quem já produz para que possa produzir mais e melhor, i.e. com um padrão de nível internacional para que possa exportar? Pois bem, as recomendações normalmente têm sido no sentido de proteger QUEM JÁ PRODUZ.

Recomenda-se proteger PARA PRODUZIR quando já existe uma certa produção local dos inputs necessários para se fomentar o surgimento de outras indústrias. Exemplo[1]: se tivermos uma produção significativa de frutas, podemos pensar em restringir a importação de sumos de fruta para incentivar o surgimento desta indústria a nível local.

Notem que mesmo quem já produz e recebe uma certa protecção deve ser-lhe dado um tempo definido para dentre outras coisas: tratar de adquirir localmente os inputs necessários para a sua produção. Afinal um produtor sério consegue incentivar o surgimento de outras indústrias, criando um cluster que torne o custo da sua operação muito mais competitivo para que uma vez removida a protecção esteja em condições de competir internamente e talvez em condições de exportar.




[1] Neste simples exemplo podemos ver como funciona a articulação entre a agricultura (a base) e a indústria (o tal factor decisivo que tanto se fala em Angola desde a independência). Ver posts anteriores sobre a protecção 24 Maio 2015 sobre exemplos de criação de clusters 7 Novembro 2014.

domingo, 26 de julho de 2015

“We must export or die” – Bismarck (2)

No nosso primeiro post sobre este assunto, 26 Abril 2015, terminamos enfatizando que Angola deveria “Exportar ou morrer” tal e qual Bismarck explicou aos alemães no seu tempo (1815-1898). Neste post vamos expandir a nossa reflexão aproveitando para apresentar o que pode ser feito para se criar em Angola essa mentalidade exportadora.

Recentemente ao vermos parte da comunidade internacional a alcançar um acordo histórico com o Irão abrindo assim a possibilidade de se reduzir ou mesmo acabar com as sanções que limitam as exportações petrolíferas deste país, ficamos ainda mais preocupados com a nossa ainda frágil situação. Em Angola o discurso político, no que a estratégia de desenvolvimento industrial diz respeito, tem-se centralizado na necessidade do país se industrializar para substituir as importações e poupar divisas.

Isso por si só não é suficiente, dai ter o governo mostrado a intenção de criar a ANPEX – Agencia Nacional de Promoção das Exportações de Angola, entidade que vai ajudar o país a dar o próximo passo no que ao processo de industrialização diz respeito. Agora vamos não só tratar de poupar divisas como também diversificar as nossas fontes de divisas.

O maior problema que identificamos no post de 26 Abril 2015 foi a limitada opção disponível. Das 27 empresas ligadas a Associação de Empresas Exportadoras de Angola, por exemplo, apenas 7 (5 ligadas ao sector agrícola e 2 as pescas) poderiam verdadeiramente pensar em exportar (desde que cumprissem com os requisitos).

Essa realidade, apesar de dura, nos mostra que muito ainda há que ser feito para que o novo passo no longo processo de industrialização possa ser dado de forma sustentável. Contudo, sendo um país em via de desenvolvimento, Angola (e os angolanos a vários níveis) tem alguns exemplos que poderia aproveitar.

A história do desenvolvimento de países como a Coreia do Sul e Taiwan, Malásia e Singapura nos mostra que um factor importante do seu sucesso foi a capacidade de passar de um processo de industrialização virado a substituição das importações por outro focalizado nas exportações. Esses países perceberam muito cedo que apesar de ser importante substituir as importações é ainda muito mais crítico garantir novas fontes de divisas por meio das exportações.   

Para tal esses países trataram não só de identificar os sectores em que poderiam concorrer com algum sucesso a nível do comércio internacional como também criaram condições (ex.: infra-estruturas) através da contrução de Zonas Económicas Especiais que permitiram a deslocação de empresas estrangeiras e o surgimento de outras de caracter nacional (ex.: China, Malásia). A Índia, por exemplo, por ter antes treinado um número exagerado de engenheiros com especial ênfase no sector de informática hoje tornou-se num dos maiores hubs (centros) de informática a nível mundial.    

Existem várias formas de se dinamizar as exportações. Mas o sucesso para esses países surgiu porque eles foram capazes de produzir produtos de elevada qualidade (produtos da marca Samsung e Kia fazem hoje parte do quotidiano angolano ao lado de marcas europeias e americanas) de forma eficiente com a criação, por exemplo, de métodos de produção JIT – Just in Time. Notem que as empresas japonesas, por exemplo, adoptaram os princípios de Gestão (Total da Qualidade) propostos pelo professor americano W. E. Deming muito antes das empresas americanas.

Assim sendo, pensamos que as empresas angolanas não precisam de primeiro esgotarem o processo de substituição das importações para depois pensarem em exportar. É importante percebermos que devemos criar essa mentalidade virada para o mercado exterior desde muito cedo, apostando na produção eficiente de produtos de alta qualidade, identificando em que empresas e produtos made in Angola apostar, perceber quais são as exigências para os exportadores nesses mercados externos se quisermos ter sucesso.

Os nossos empreendedores têm hoje disponíveis bons exemplos. Tal, contudo, não isenta o estado das suas responsabilidades. Caberá ao estado fazer os nossos empreendedores perceberem que Angola tem duas opções: “Exportar ou morrer”! Para tal a criação de incentivos, que não passam necessariamente pela simples e directa redução ou isenção de impostos mas que através da (1) alocação de verbas para que os nossos académicos[1] possam desenvolver estudos que venham a identificar sectores, mercados para os produtos made in Angola, (2) condicionar qualquer redução ou isenção de impostos ao alcance de metas de exportação previamente definidas, (3) ligar o sector de exportação a política externa (ex.: condicionar uma parte da verba para ajuda externa a aquisição de bens e serviços made in Angola). Por exemplo, quando Angola ajudou a República Centro Africana poderia aproveitar para, como parte do pacote de ajuda, abrir novos mercados para alguns produtos made in  Angola.   
A necessidade de se identificar novas fontes sustentáveis de divisas é real e como tal precisa de atenção já, sob pena de sermos incorporados a nível regional (ex.: na zona de comércio livre da SADC) e mundial de forma adversa!

 




[1] Nem sempre será possível encontrar mercado para todos os produtos made in Angola, dai que poderá ser necessário identificar e apoiar aqueles que possam ter uma maior possibilidade de sucesso.

domingo, 14 de junho de 2015

Dlamini Zuma (Presidente da Comissão Africana) parece ‘surpresa’ pelo fraco comércio intra-africano, já eu não!

Achei muito interessante a constatação feita pela Presidente da Comissão Africana na semana passada, quando afirmou que os países africanos precisam aumentar o comércio entre si. Foi mencionado o facto de os países africanos registarem um comércio maior com países fora do continente do que com os seus vizinhos.

Após uma breve revisão com intuito de determinar quais têm sido as recomendações apresentadas para este problema, fiquei espantado ao notar que a necessidade que os países africanos, na generalidade (um pouco menos para o caso da África do Sul), têm de industrializar para poderem aumentar o volume das trocas comerciais entre si não aparece de uma maneira explícita. Fala-se, ao invés, abertamente da necessidade de se implementar reformas, de haver uma certa vontade politica, necessidade de se melhorar as infra-estruturas, criação de zonas de comércio livre por ai adiante.

Mas notem que a grande maioria dos países africanos são produtores de produtos primários i.e. matéria-prima. Olhemos por exemplo o caso de Angola, onde o petróleo tem uma preponderância muito forte nas exportações, o país precisa identificar clientes com uma necessidade de consumo muito forte. Antes os nossos maiores clientes eram os europeus e americanos e hoje são essencialmente os chineses.

Como explicamos no nosso post de 1 de Março de 2015, Angola precisa industrializar-se se quiser melhorar o que a literatura trata por terms of trade (i.e. termos de negociação). Desta forma para além de exportar/comercializar matéria-prima bruta iriamos igualmente comercializar produtos acabados com valor acrescentado.

Países como a Etiópia, a África do Sul estão seriamente apostados na industrialização. Angola ainda está numa fase muito básica limitando-se na produção de algum material para o sector da construção e na produção de bebidas. Tudo a ser feito com matéria-prima essencialmente importada! Vale acrescentar que a pouca produção interna esta virada para o mercado local e não para a exportação e captação de divisas. Para darmos passos mais sérios, Angola poderia começar por aplicar algumas das ideias discutidas nos nossos posts anteriores essencialmente no de 10 de Julho de 2014 e similares.

Assim sendo, pensamos nós que não basta dizer que África precisa aumentar o comércio interno. A pergunta certa, em nosso entender, seria: Como África poderia rapidamente se industrializar[1] para aumentar as trocas comerciais no continente?



[1] Afinal se tivermos em conta as 3 Regras do Desenvolvimento[1] propostas por Kaldor (1967):
(1)   Todos os países se desenvolvem e atingem altos níveis de rendimento per capita através da industrialização.
(2)   Na etapa inicial as indústrias nascentes desenvolvem-se através de uma certa protecção.
(3)   Quem dizer o contrário estará mentindo.
 

domingo, 7 de junho de 2015

Desarticulação da ANIP e a questão do Limited access order

Nos últimos posts frisamos a necessidade de haver uma melhor coordenação do investimento privado estrangeiro ou nacional se quiséssemos evitar o que analisamos nos posts de 28 de Setembro 2014 e 15 de Março de 2015. Contrariamente ao que a história do desenvolvimento económicos de países como o Japão, Taiwan, Coreia do Sul apenas para citar os mais proeminentes, nos ensina, isto é, estes países criaram agências responsáveis pela coordenação de investimentos em Angola, pelo que tomamos conhecimento através da imprensa local, parece que estaremos a sair de uma situação de concentração (creio acreditar mesmo, de uma certa coordenação) de esforços para descentralização do processo de investimento estrangeiro.

Vale recordar aqui as razões que serviram de base para a criação da ANIP[1]. Essa entidade surgiu, de forma resumida, para garantir uma melhor coordenação e acompanhamento do investimento privado (nacional ou estrangeiro), facilitar o acesso a informação, propondo a adopção de incentivos de várias formas, garantir que os sectores identificados como prioritários recebam o volume de investimento necessário.

Países em desenvolvimento como Angola sofrem o que a literatura chama de Limited access order[2] i.e. acesso limitado. Isto é, no contexto do tema em análise, para qualquer projecto de investimento, por exemplo, o investidor muitas vezes acaba por enfrentar várias barreiras as quais deve transpor para poder materializar o seu projecto. Este exercício torna oneroso o processo de investimento privado em países em desenvolvimento. Podemos mesmo acrescentar que num contexto de acesso limitado, a possibilidade de se incorrer a subornos para viabilizar-se projectos de investimentos é quase sempre uma realidade.

Apresentado desta forma, preocupa-nos saber que ao invés de reforçarmos a capacidade de actuação do actual organismo responsável pela coordenação do investimento privado, ANIP, vamos tratar de descentralizar. Sabendo que estamos num contexto de acesso limitado e a luz do que foi anterior ilustrado, acreditamos que poderemos estar igualmente a descentralizar males como o suborno e a corrupção.

Que o investimento privado (nacional ou estrangeiro) em Angola precisa ser melhor coordenado se quisermos desenvolver de forma sustentável o sector não mineral da nossa economia não temos como negar (ver por exemplo o post 1 de Março de 2015), contudo, ao descentralizar o processo de coordenação e acompanhamento do investimento privado num contexto de acesso limitado corre-se o risco de dificultar a tão desejada transformação estrutural da nossa economia.

Isto porque, num contexto de descentralização mas com acesso limitado, a possibilidade de criarmos o que chamamos de corrupção produtiva (ao invés da corrupção parasitária, ver post de 23 de Agosto de 2013) é bastante reduzida.

 




[1] Ver Estatuto Orgânico da ANIP disponível em: http://www.anip.co.ao/index.php?pag=conteudos&id=13
[2] Veja por exemplo Douglass North et al. (2007)