quarta-feira, 24 de julho de 2013

"Ante-Projecto de Revisão da Lei Geral do Trabalho" versus “Estabilidade no Emprego”

Quando tomamos conhecimento que existia um Ante-Projecto de Revisão da Lei Geral do Trabalho em Angola, ficamos curiosos e ao mesmo tempo apreensivos, afinal fazia alguns meses que tínhamos terminado um artigo sobre este assunto1.

Um dos desafios que identificamos na altura foi que Angola teria que implementar reformas se realmente quisesse atrair (como parece ser plano do nosso governo, se tivermos em conta o que é divulgado na imprensa) empresas de países europeus em crise (a saber Espanha, Itália e Portugal) e com os quais Angola já tem um relacionamento comercial assinalável. Contudo, também elucidamos no referido trabalho que em caso de reforma, tal reforma não deveria comprometer as aspirações, legítimas, da juventude de ter um emprego seguro e acima de tudo decente.

Apesar de termos lido algum tempo atrás num jornal privado “Revisão da Lei Geral do Trabalho Garante Estabilidade no Emprego”, chamou-nos a atenção duas alterações que estão a ser propostas agora, que no nosso entender, inviabilizariam a tão desejada “Estabilidade no Emprego” conforme fora noticiado, pelo seguinte:

No artigo 16º Duração do contrato por tempo determinado, do Ante-Projecto lesse:

1. O contrato de trabalho por tempo determinado pode ser sucessivamente renovado até um período máximo de cinco anos.


2. Nas micro, pequenas e médias empresas, o contrato por tempo determinado pode ser sucessivamente renovado até ao limite de dez anos.

Urge reflectirmos se um trabalhador perder o seu emprego (neste caso legalmente, sem direito a indeminização) após 5 ou 10 anos de trabalho contínuo traduz-se em estabilidade?

Por outro lado, no artigo 72º ponto 4 existe uma omissão, no nosso entender, importante pelo seguinte:

Na presente lei

4. “Nos 30 dias seguintes à mudança de empregador, os trabalhadores podem despedir-se, tendo direito à indemnização por despedimento indirecto se provarem que da mudança podem resultar prejuízos para a relação jurídico-laboral [meu ênfase].”

No presente Ante-projecto de Lei existe uma omissão:
4. “Nos 22 dias úteis seguintes à mudança de empregador, os trabalhadores têm direito de rescindir o contrato de trabalho com aviso prévio.”
A nosso ver essa omissão prejudicaria o trabalhador.

Se por um lado, compreendemos a necessidade de se reformar a lei para que Angola se torne mais competitiva (e seja capaz de atrair mais investimento estrangeiro), por outro lado entendemos que essa necessidade de atrair investidores estrangeiros não deveria fragilizar a relação jurídico-laboral do trabalhador angolano. Se tivermos em conta tanto as potênciais fontes alternativas de receitas bem como a densidade populacional de Angola, poderemos perceber que cheap labour (mão de obra barata) não é a nossa vantagem comparativa.

Em jeito de meio-termo: O governo poderia avançar com incentivos fiscais, até que seja capaz de criar a chamada safety net social (garantia de estabilidade social) tal como o subsídio de desemprego, até que possa garantir acesso a assistência médica, educação e ao transporte público condigno, fazendo uso das receitas provenientes do petróleo e de outros minerais. Vale relembrar que a estabilidade no emprego gera estabilidade social que por sua vez serve de base para qualquer projecto de desenvolvimento económico sério. A questão que deverá merecer a nossa atenção é a seguinte:

Devemos primeiro

a) Reformar a lei? Ou

b) Criar mecanismos que garantam a estabilidade social? 

 

(1) Wanda, Fernandes (2013) “Emprego, Juventude, Desemprego: Que solução nos Oferece o Programa de Governo do MPLA 2012-2017”. SOAS, University of London. [Submetido a Revista Cientifica da FE-UAN]

domingo, 21 de julho de 2013

"Angola: Opções para a prosperidade" - 7 anos depois: Quo vadis?

Resumo

Em 2006, o Professor Paul Collier apresentou o que na sua óptica seriam as 5 opções que poderiam levar Angola a prosperidade. Passados 7 anos, decidimos fazer uma constatação da realidade e notamos que os aspectos macroeconómicos sugeridos estão de certa forma resolvidos. Apesar disso, ainda não se constata uma melhoria da condição social de todos os angolanos.

Abstract

In 2006, Professor Paul Collier presented what he believed to be 5 options that Angola should take for prosperity. After 7 years, we have decided to do a reality check, and noticed that the required macroeconomics changes were, somehow, achieved; however there is still a lot to be done in other to improve the social conditions of the Angolan people.

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Quando Angola completou 31 anos de independência em 2006, o Professor Paul Collier teve a inusitada ideia de escrever um ensaio sobre as nossas opções para alcançarmos um desenvolvimento sustentável e que estivesse ao alcance de todos os angolanos independentemente da sua, raça, origem étnica e condição social. Na sua conjuntura, Collier (2006) apresenta-nos 5 pontos (ver figura 1 abaixo) que no seu entender podem fazer a diferença entre o sucesso ou o fracasso nesta fase de reconstrução nacional.

Passados 7 anos e tendo em conta que faltam 12 anos (dentro do programa de longo prazo do Governo de Angola, Angola 2025) parece-nos pertinente, saber se o que foi "profetizado" materializou-se ou esta em vias de ser materializado e deste exercício, termos uma ideia do que Angola poderá vir a ser nos próximos 12 anos. O que se segue é o que poderíamos chamar de um exercício de constatação e auto-avaliação. Vale aqui recordar que a proposta apresentada por Collier (2006) não era vinculativa pelo que, o Governo de Angola não estava (nem está) obrigado a considerar tais recomendações. Isso por si só representa uma das grandes limitações do nosso exercício. Contudo, a pertinência reside em sabermos se estando disponíveis algumas recomendações fruto de dois bons exemplos (um de sucesso, a Malásia e outro menos bem sucedido, a Nigéria) para que sentido está o país mais inclinado 7 anos depois. Vamos partir do princípio de que seriamos capazes, enquanto país, de aprender com as experiências de desenvolvimento (ou ausência de desenvolvimento) de outros países, tendo em conta que nenhum país desenvolve-se ao acaso.
 
1. Corrigir as discrepâncias macroeconómicas;
2. Estabelecer 3 sistemas de gastos públicos;
3. Conter a possibilidade de surgimento do proteccionismo político;
4. Gerir as (possíveis) divisões pós-conflito;
5. Fazer crescer a Economia não petrolífera.
Fig. 1 As cinco (5) recomendações do Professor Paul Collier, adaptado de Collier (2006)2
 

1. Corrigir as discrepâncias macroeconómicas
Neste capítulo o Professor Collier sugeria que fossem executadas 3 tarefas a saber: Obter um superavit fiscal, Elaborar um programa de investimento a médio-prazo e Baixar a inflação.

Para a primeira tarefa, acredito que o Governo foi capaz de atingir um resultado positivo nos últimos 6 anos a excepção de 20093 consequência da crise económica mundial, quando se pensava estarmos imunes. A segunda tarefa de certa forma também foi executada com sucesso. O Governo de Angola tem um programa de investimento público, existe igualmente o programa de desenvolvimento de longo prazo Angola 2025. Contudo, poderíamos questionar a pertinência de alguns investimentos programados, os valores alocados bem como a qualidade dos mesmos (após execução). Por último, que actualmente a inflação em Angola esteja abaixo dos 10%.

Quanto a independência do Governador do Banco Nacional de Angola, a Lei n.º 16/10 de 15 de Julho Lei do Banco Nacional de Angola define no seu Artigo 50 que o mesmo tem um mandato de 5 anos e que só pode ser exonerado com base no Artigo 77 ponto 2 alíneas a, b da mesma lei. Contudo, muitos deverão concordar que ainda estamos longe de ter um Banco Central livre de pressões e influências do poder político.

Assim sendo, quero acreditar que neste capítulo poderíamos dar ao Governo um sinal de aprovação.

2. Estabelecer 3 sistemas de gastos públicos
Podemos assinalar que nos últimos 6 anos houve um significante aumento das despesas públicas (i.e. investimento público). Faziam parte das recomendações a criação dos seguintes sistemas: Estabelecer um sistema de licitação e avaliação de obras, Aumentar o gasto social e a sua prestação de contas e Fazer uma distribuição directa das receitas do petróleo através de programas sociais.

É dado adquirido que o acesso a informação é deficiente, especialmente informação ligada ao financiamento de muitos dos projectos em execução (particularmente em Luanda). Contudo, foi aprovada a Lei n. 20/10 - Lei da Contratação Pública, que no seu Artigo 2 (Âmbito de aplicação) define que essa lei é essencialmente "aplicável à contratação de empreitadas de obras públicas, à locação e aquisição de bens móveis e imóveis e à aquisição de serviços por parte de uma entidade pública contratante". Resta agora velar pela sua aplicação prática.

Actualmente o Indicador de Desenvolvimento Mundial do Banco Mundial4 classifica Angola como um país de renda média alta. Isso significa que muitos dos que advogam para implementação de um programa social como o cash transfer (transferência de dinheiro directamente as famílias mais necessitadas) talvez não estejam tao errados assim, uma vez que pesquisas mostram que quando bem implementado este programa ajuda a reduzir a pobreza, não distorce o mercado e dá, aos beneficiários, a possibilidade de utilizarem os valores da forma mais conveniente (cf. Standing, 2011)5.
É preciso reconhecer que 36.6% da população angolana (de acordo com o IBEP 2008-2009)6 é pobre e que para essas famílias um programa de microcrédito talvez não seja a política mais apropriada. Resumindo, devemos reconhecer que progredimos muito pouco.

3. Conter a possibilidade de surgimento do proteccionismo politico
Em países em transição e com grandes receitas de recursos minerais, corre-se o risco de se fazer um aproveitamento político dessas receitas (cf. Collier, 2006). Neste ponto foi-nos proposto executar as seguintes acções: Estabelecer formas de fiscalização, Limitar o financiamento de campanhas políticas, Tornar o cidadão mais bem informado.

Para a primeira tarefa, temos a Assembleia Nacional com os seus Deputados eleitos, cabendo agora aos eleitores exigirem que ela assuma o seu papel de órgão fiscalizador das acções do Executivo. Urge igualmente exigir a isenção dos tribunais. Em termos de gastos com campanhas políticas ainda temos muito que fazer para se corrigir as disparidades verificadas nas últimas eleições. Precisa-se igualmente de se ter uma imprensa mais livre de influências partidárias. O acesso a informação apesar de ser um direito constitucionalmente consagrado (ver Artigo 40 da Lei Constitucional), a sua materialização ainda reveste-se de certos constrangimentos. Em suma, neste ponto Angola ainda tem muitas oportunidades de melhorias.

4. Gerir as (possíveis) divisões pós-conflito
Por formas a se evitar a possibilidade do ressurgimento de um novo conflito (fruto de divisões sociais), Collier (2006) apresenta-nos as seguintes opções: Crescimento mais alargado, Priorizar as despesas de caracter social, Reduzir significativamente as despesas de caracter militar.

O crescimento alargado passaria essencialmente pela diversificação da nossa economia. Infelizmente Angola continua excessivamente dependente das receitas provenientes dos recursos minerais, em particular do petróleo (ver o Orçamento Nacional de 2013)7.

No que toca ao incremento de investimento no sector social, temos que reconhecer que foi feito um esforço gigantesco, com a construção de mais escolas, postos de saúde e outras infra-estruturas sociais e acesso a serviços básicos como água e luz. Contudo, o fornecimento desses serviços básicos (água e luz) ainda é bastante deficiente.

Por último, apesar da ausência de conflito armado na maior parte do território angolano, devemos reconhecer que ainda temos uma situação pendente na província de Cabinda bem como temos presenciado momentos de instabilidade além-fronteiras, o que de certa forma nos afecta enquanto país. Contudo, esperava-se uma redução gradual das despesas de caracter militar o que não tem acontecido.

Neste capítulo podemos ver que Angola ainda não apresenta melhorias, dai a necessidade de se reflectir sobre as reais causas de tão fraco desempenho neste ponto.

5. Fazer crescer a Economia não petrolífera
Collier (2006) propõe-nos as seguintes medidas: Desregular e remover os impostos a economia não petrolífera, Permitir o crescimento do sector Agrário. Para a primeira proposta, apesar de ter como razão de ser a possibilidade de se captar um número maior de investimento privado, a ser adoptada acreditamos que deveria ser uma medida com tempo determinado visando promover o aumento da produtividade.

Ao apresentar um Orçamento Geral de Estado dependente (excessivamente) das receitas provenientes do petróleo e de outros minerais, Angola mostra que um dos grandes riscos que os países exportadores de matérias-primas (commodities) minerais estão sujeitos é o desinvestimento na agricultura (dos 57.590.000 hectares disponíveis para o efeito, o país está a utilizar apenas 5,7%)8. Apesar de existir um programa de desenvolvimento agrário acoplado ao Mega Cluster Alimentação e Agro-indústria, conforme nos mostra o Programa Angola 2025, os ganhos recentes neste sector ainda não retiraram Angola da lista dos países em risco de deficit alimentar9.
Apesar de nos ter sido apresentado, por Collier (2006), como um ponto moderadamente fácil de ser implementado, Angola ainda tem um longo caminho a percorrer.

Em jeito de conclusão, podemos ver que alguma coisa já foi feita nos últimos 7 anos, especialmente no que toca aos aspectos macroeconómicos, o que é bastante positivo. Contudo, isso por si só não basta, é preciso políticas que visem assegurar aos cidadãos uma melhoria das suas condições sociais. Há indícios de existir alguma vontade politica, afinal já existe um programa de desenvolvimento a longo prazo "Angola 2025" e actualmente existe o "Plano Nacional de Desenvolvimento 2013 -2017". Angola, enquanto país, ainda tem pela frente 23 anos, dentro do horizonte temporal apresentado por Collier (2006) e 12 anos se tivermos em conta o programa "Angola 2025", para corrigirmos as debilidades identificadas nesta reflexão. Queremos acreditar que na nossa próxima revisão, possamos todos ter a certeza que estamos no caminho certo, rumo ao tão almejado desenvolvimento sustentável.

A ser assim, seria a primeira vez que um país da Africa Subsariana pudesse, contra todas as espectativas, surpreender pela positiva fazendo o que foi feito em outras partes do mundo (exemplo Ásia) mas muito raramente em África, i.e. reerguer-se de uma situação de pós-conflito para uma situação de prosperidade plena. As oportunidades que tiveram países como a Coreia do Sul e Taiwan, não são as mesmas que países como Angola têm hoje. A luz desta realidade e dos dois exemplos que nos foram dados, Nigéria e Malásia hoje, urge percebermos que amanhã, Angola, poderá não ter desculpas pelo seu fracasso.
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1 Este trabalho foi feito durante a minha estadia na School of Oriental and African Studies, Universidade de Londres como Chevening Scholar 2012-13.
2 Estas recomendações podem ser encontradas em Collier, P. (2006). "Angola: Options for Prosperity". Disponível através do endereço: http://users.ox.ac.uk/~econpco/research/pdfs/Angola-OptionsforProsperity.pdf
3 Para mais informação consulte o Relatório Angola Economic Outlook 2012, disponível: www.africaneconomicoutlook.org
4 Os dados podem ser acedidos através do endereço electrónico: http://data.worldbank.org/country/angola
5 G. Standing (2011). ‘How cash transfers promote work and economic security’, in J.K. Sundaram and A. Chowdhury (eds.), Poor Poverty: The Impoverishment of Analysis, Measurement and Policies. London and New York, Bloomsbury Academic, pp.197-221
6 Instituto Nacional de Estatística (2011). Inquérito Integrado sobre o Bem-Estar da População: Relatório Analítico – Vol. I, Luanda: INE, p. 129.
7 Contudo, Wanda (2013b) mostra que apesar desta concentração a economia esta a diversificar-se. 
8 Fonte: FAO http://www.countrystat.org/home.aspx?c=AGO&p=ke
9 Veja por exemplo, Wilson, Katy (2012) One Billion Hungry: Can we feed the world? Facts and Figure. Disponivel através do endereço: http://www.canwefeedtheworld.org/ acedido 12 Fev. 2013.

Bloom and Sachs (1998) paper and Angola’s loss of Economic Diversification

Came across a paper by Bloom and Sachs (1998), after having had the pleasure to see Sachs delivering a talk on former US Pres. Kennedy at LSE Ideas last Monday 15 July.
Well, I needed to read the paper as part of me setting up my literature review for my current research project on economic diversification in Angola. But, what caught my attention, and made me write about that, was not really anything more than the fact that researchers are often trying to explain why Africa (particularly its sub-Saharan part) is by all means (and measures) always lagging behind (with particular emphasis to economic development).
I really found their arguments interesting while at the same time annoying. They argue that geography seems to "conspire" against Africans making them less productive and prone to all sorts of malaise. Sure, they (as usual) provide all sort of evidence to support this main idea.
Some days ago, I read a book edited by Oya and Santamaria (2007) and found an interesting and curious observation that Oya makes on Bloom and Sachs (1998) paper, which he built from H-J Chang, that maybe (to escape this "geography curse") African countries should military invade those countries far from the tropics and eventually change their fate! This was just one more example of how Africa (and Africans) seem to be very often misrepresented, and how its problems tend to be looked at, by some researchers, without taking into account historical processes.
As I progress with my research on Angola, I see a country whose economy used to be diversified (I was surprised to find out that Angola was once the 4th world producer of coffee! So we had to have some agricultural knowledge and expertise to be there), oil was only found around the 50s and it was mainly during the war followed the independence from Portugal in 1975 that it took the prominence it has today. Would anyone call that "Dutch disease" or "resources curse" effect? I wonder how one would expect people to farm while bullets are being shot at them and when young people were being dragged to the front lines to fight, instead of being given chance to be educated and farm the land.