quinta-feira, 1 de janeiro de 2015

Desvalorização da moeda, mais investimento (privado) e mais emprego?

A chamada “Dutch Disease” ou “doença holandesa” manifestasse de uma forma simplista em países ricos em recursos naturais, como o caso de Angola, através da valorização artificial da moeda, o que faz com que os produtos nacionais tenham um custo de produção superior aos importados. Como resultado, para o caso de Angola, um Kwanza forte pode ser bom (a curto prazo) para os consumidores que têm as suas poupanças em moeda nacional mas a longo prazo acaba por desencorajar a produção nacional. Isso pode acentuar ainda mais a dependência dos recursos financeiros provenientes da venda de recursos naturais para sustentar a importação de produtos acabados.
Uma solução, muitas vezes proposta, passa por desvalorizar a moeda nacional, por formas a tornar mais competitiva a produção nacional, incentivando desta forma a exportação, e enfraquecer o poder de importação de produtos acabados. Claro, uma tal medida como se pode compreender, acaba por ser impopular junto dos trabalhadores e consumidores nacionais que vêm reduzido o seu poder de compra mas supostamente é bem-vinda para os empresários/investidores.
Acreditasse que desvalorizando a moeda (fazendo surgir assim a inflação), estimule mais investimentos na economia nacional criando-se desta forma mais oportunidades de emprego. Apresentada desta forma desvalorizar a moeda para gerar mais empregos parece ser um trade off (uma contra partida) até certo ponto aceitável.
Contudo, é necessário analisar se após um processo de desvalorização da moeda a contrapartida criação de mais emprego através de mais investimentos privados (afinal a demanda por bens de consumo e serviços antes suprida por produtos importados ainda mantem-se e precisa ser satisfeita) passa a ser uma realidade.
Como ponto de partida, é importante percebermos que não existe uma ligação tipo causa-efeito, isto é, que uma desvalorização da moeda resulta necessariamente num aumento do investimento privado/ aumento da oferta de emprego (Desvalorização da moeda à Aumento de investimento/emprego?) mas que tal inferência baseia-se na concepção neoclássica da economia (que sugere que indivíduos racionais poderiam tirar proveito do aumento da competitividade da produção nacional face aos produtos importados).
Com uma desvalorização da moeda podemos até ter um aumento do investimento na economia, contudo, nada garante que tal investimento seja feito em sectores produtivos capazes de gerar empregos de qualidade (i.e. empregos que proporcionem aos trabalhadores um nível de vida aceitável). Uma rápida analise das intenções de investimento privado do capital de origem angolana indica-nos que nos últimos 10 anos as intenções para a indústria manufactureira (aquela capaz de transformar uma economia) estão concentradas essencialmente na indústria de materiais de construção (com o agravante de receber pouco input de outros sectores da economia local) e na indústria de bebidas que apesar de ter alguma ligação com outros sectores da economia local (exemplo a fabricação de latas e garrafas já é feita localmente) ainda assim muito do seu input tem que ser igualmente importado. Vale perguntar por que razão nos últimos 10 anos Angola não foi capaz de criar uma indústria agro-alimentar forte e com mais possibilidade de absorver uma grande fatia da sua força de trabalho?
Este simples exemplo ajuda-nos a perceber que mesmo na presença de investimento (fruto, por exemplo, de uma incentivadora desvalorização da moeda) pode ser ainda necessário direccionar melhor tais investimentos para sectores que realmente venham a proporcionar uma melhor articulação/interligação dos vários sectores da economia, contribuindo assim para uma redução da dependência do petróleo e mudança da matriz produtiva do país resultando na tão desejada transformação estrutural.
PS: Como alumni do African Programme on Rethinking Development Economics, foi possível perceber que isto só é possível quando um país elabora uma Politica Industrial séria e articulada com outras políticas (ex.: comercial, monetária, de compras para o sector público, criação de ZEE), coisa que países como a Africa do Sul já têm mas que Angola ainda está por fazer.