domingo, 26 de julho de 2015

“We must export or die” – Bismarck (2)

No nosso primeiro post sobre este assunto, 26 Abril 2015, terminamos enfatizando que Angola deveria “Exportar ou morrer” tal e qual Bismarck explicou aos alemães no seu tempo (1815-1898). Neste post vamos expandir a nossa reflexão aproveitando para apresentar o que pode ser feito para se criar em Angola essa mentalidade exportadora.

Recentemente ao vermos parte da comunidade internacional a alcançar um acordo histórico com o Irão abrindo assim a possibilidade de se reduzir ou mesmo acabar com as sanções que limitam as exportações petrolíferas deste país, ficamos ainda mais preocupados com a nossa ainda frágil situação. Em Angola o discurso político, no que a estratégia de desenvolvimento industrial diz respeito, tem-se centralizado na necessidade do país se industrializar para substituir as importações e poupar divisas.

Isso por si só não é suficiente, dai ter o governo mostrado a intenção de criar a ANPEX – Agencia Nacional de Promoção das Exportações de Angola, entidade que vai ajudar o país a dar o próximo passo no que ao processo de industrialização diz respeito. Agora vamos não só tratar de poupar divisas como também diversificar as nossas fontes de divisas.

O maior problema que identificamos no post de 26 Abril 2015 foi a limitada opção disponível. Das 27 empresas ligadas a Associação de Empresas Exportadoras de Angola, por exemplo, apenas 7 (5 ligadas ao sector agrícola e 2 as pescas) poderiam verdadeiramente pensar em exportar (desde que cumprissem com os requisitos).

Essa realidade, apesar de dura, nos mostra que muito ainda há que ser feito para que o novo passo no longo processo de industrialização possa ser dado de forma sustentável. Contudo, sendo um país em via de desenvolvimento, Angola (e os angolanos a vários níveis) tem alguns exemplos que poderia aproveitar.

A história do desenvolvimento de países como a Coreia do Sul e Taiwan, Malásia e Singapura nos mostra que um factor importante do seu sucesso foi a capacidade de passar de um processo de industrialização virado a substituição das importações por outro focalizado nas exportações. Esses países perceberam muito cedo que apesar de ser importante substituir as importações é ainda muito mais crítico garantir novas fontes de divisas por meio das exportações.   

Para tal esses países trataram não só de identificar os sectores em que poderiam concorrer com algum sucesso a nível do comércio internacional como também criaram condições (ex.: infra-estruturas) através da contrução de Zonas Económicas Especiais que permitiram a deslocação de empresas estrangeiras e o surgimento de outras de caracter nacional (ex.: China, Malásia). A Índia, por exemplo, por ter antes treinado um número exagerado de engenheiros com especial ênfase no sector de informática hoje tornou-se num dos maiores hubs (centros) de informática a nível mundial.    

Existem várias formas de se dinamizar as exportações. Mas o sucesso para esses países surgiu porque eles foram capazes de produzir produtos de elevada qualidade (produtos da marca Samsung e Kia fazem hoje parte do quotidiano angolano ao lado de marcas europeias e americanas) de forma eficiente com a criação, por exemplo, de métodos de produção JIT – Just in Time. Notem que as empresas japonesas, por exemplo, adoptaram os princípios de Gestão (Total da Qualidade) propostos pelo professor americano W. E. Deming muito antes das empresas americanas.

Assim sendo, pensamos que as empresas angolanas não precisam de primeiro esgotarem o processo de substituição das importações para depois pensarem em exportar. É importante percebermos que devemos criar essa mentalidade virada para o mercado exterior desde muito cedo, apostando na produção eficiente de produtos de alta qualidade, identificando em que empresas e produtos made in Angola apostar, perceber quais são as exigências para os exportadores nesses mercados externos se quisermos ter sucesso.

Os nossos empreendedores têm hoje disponíveis bons exemplos. Tal, contudo, não isenta o estado das suas responsabilidades. Caberá ao estado fazer os nossos empreendedores perceberem que Angola tem duas opções: “Exportar ou morrer”! Para tal a criação de incentivos, que não passam necessariamente pela simples e directa redução ou isenção de impostos mas que através da (1) alocação de verbas para que os nossos académicos[1] possam desenvolver estudos que venham a identificar sectores, mercados para os produtos made in Angola, (2) condicionar qualquer redução ou isenção de impostos ao alcance de metas de exportação previamente definidas, (3) ligar o sector de exportação a política externa (ex.: condicionar uma parte da verba para ajuda externa a aquisição de bens e serviços made in Angola). Por exemplo, quando Angola ajudou a República Centro Africana poderia aproveitar para, como parte do pacote de ajuda, abrir novos mercados para alguns produtos made in  Angola.   
A necessidade de se identificar novas fontes sustentáveis de divisas é real e como tal precisa de atenção já, sob pena de sermos incorporados a nível regional (ex.: na zona de comércio livre da SADC) e mundial de forma adversa!

 




[1] Nem sempre será possível encontrar mercado para todos os produtos made in Angola, dai que poderá ser necessário identificar e apoiar aqueles que possam ter uma maior possibilidade de sucesso.

quinta-feira, 2 de julho de 2015

Por que razão pensar que o auto-emprego vai resolver o problema do desemprego em Angola pode ser uma falácia.

Algum tempo atrás fiz uma apresentação académica sobre o realce exagerado que se estava a dar a promoção do auto-emprego como uma alternativa/solução a já preocupante falta de capacidade de criação de emprego no sector formal da nossa encomia que segundo estatísticas recentes[1] colocam o desemprego acima dos 25%.

Tendo Angola uma população relativamente jovem[2] é necessário percebermos que a criação de empregos capazes de garantir uma melhoria das condições sociais dos trabalhadores e consequentemente garantir uma certa estabilidade laboral (e social) deverá advir da nossa capacidade de criarmos uma indústria manufactureira forte.

No nosso post de 1 de Março 2015 explicamos que Agostinho Neto através da sua célebre frase “A agricultura é a base do desenvolvimento e a indústria é o factor decisivo” já nos havia deixado uma pista de como resolver o problema da criação de empregos sustentáveis. Nos socorremos de Kaldor (1967) para explicar que para Angola criar increasing returns”, isto é, economia de escala e melhorar os seus “terms of trade” (i.e. termos de negociação) deveria desenvolver o seu sector industrial manufactureiro.  

A 20 anos atrás o Banco Mundial através do seu relatório sobre o desenvolvimento mundial de 1995 com o título Workers in an Integrated World[3] indicou que o crescimento económico na Malásia e Polónia permitiu reduzir o auto-emprego, tido nesta perspectiva como uma actividade informal. Os dados mostram-nos que em 1957 a Malásia tinha 27% neste sector de actividade (i.e. auto-emprego) mas que em 1989 reduziu para 20%. A Polónia tinha 32% em 1955 reduziu para 23% em 1990. Por outro lado, o relatório assinala que houve um aumento de trabalhadores assalariados e incorporados no mercado formal de trabalho (na Malásia aumentou de 35% em 1957 para 42% em 1989 ao passo que na Polónia aumentou de 41% em 1955 para 52% em 1990).

Contudo, os dados que o relatório nos apresenta sobre o Gana dão-nos uma perspectiva completamente diferente. O auto-emprego aumentou de 58% em 1960 para 59% em 1989 ao passo que a percentagem de trabalhadores no sector formal da economia manteve-se nos 14% em ambos os períodos cf. WB[4] (1995:16).

Hoje podemos claramente ver em que posição, na economia mundial, cada um dos 3 países acima apresentados se encontra e nos perguntar: Será que em Angola vamos reinventar a roda?




[1] A taxa de desemprego em Angola é apresentada como estando a volta dos 26%, cf. African Economic Outlook disponível em http://www.africaneconomicoutlook.org/en/country-notes/southern-africa/angola/
[2] Segundo o Observatório Economico do Instituto de Fomento Empresarial de Angola, 46% da população angolana estão numa faixa etária abaixo dos 15 anos de idade.
[3] Tradução livre: Trabalhadores Num Mundo Integrado.
[4] WB (World Bank) é a sigla inglesa do Banco Mundial (BM)