quinta-feira, 24 de setembro de 2015

Diversificação económica através do auto-emprego?

Apesar de termos já tratado, de certa forma, este tema no nosso post de 2 de Julho de 2015 somos obrigados a voltar a ele uma vez que o discurso político insiste em fazer uma colagem entre o fomento do auto-emprego e o processo de diversificação económica. Por outras palavras, para alguns dos nossos políticos, Angola também vai diversificar a economia através do auto-emprego, o que seria em nosso entender, uma acção apenas comparável ao que na cultura popular se denomina de reinvenção da roda! Afinal, até a data nenhum outro país diversificou a sua economia através do auto-emprego[1].

O que nos chama atenção neste tipo de posicionamento é a presença do que aparenta ser um certo desconhecimento do que se entende por diversificação da economia. Pois bem vamos explicar de uma forma simplista. A UNCTAD apresenta-nos a diversificação como a estrutura das trocas comerciais de um país comparada com a média mundial. Num índice de 0 a 1, quanto mais próximo do valor 1 a economia de um país estiver isso indica uma maior diferença com a média mundial. Para o caso de Angola, segundo os dados do UNCTAD[2] a economia angolana teve um índice de diversificação de 0.8 de 2002 a 2011 baixando ligeiramente em 2012. O Quénia por exemplo de 2002 a 2012 teve um índice de 0.7. A Coreia do Sul por outro lado e para o mesmo período teve um índice de 0.43 a 0.45. Como se pode perceber dos três exemplos apresentados, a Coreia do Sul tem uma economia mais diversificada.

Notem que a diversificação da economia de um país passa a ser uma necessidade inadiável por estar acoplada ao comércio mundial. Quanto menos diversificada for uma economia de um país (com um índice próximo do valor 1), menos opções a nível do comércio mundial este país terá i.e. menos possibilidade de gerar divisas. Como se sabe os países adquirirem tecnologia, bens e serviços que não produzem através do comércio (mundial) logo, é correcto sugerir que o acesso a menos divisas, reduz a possibilidade desses países se desenvolverem.

Ao se fazer esta colagem i.e. auto-emprego à diversificação económica, está-se de facto a sugerir que por via do auto-emprego Angola vai aumentar as suas opções no comércio mundial, logo, poderá através de uma maior participação (no comércio mundial ) ter outras fontes de divisas (para além do petróleo e diamante). O auto-emprego pode contribuir para a redução da pobreza (dando aos intervenientes a possibilidade de gerarem rendimentos próprios), redução do desemprego (desde que não gera o que a literatura denomina por subemprego) mas sugerir que o auto-emprego contribui para o processo de diversificação económica traduz-se no que chamamos de falácia!



[1] Não devemos confundir com cooperativas i.e. associação autónoma de pessoas.
[2]Acedido pela última vez em 6 de Junho, 2013.

sábado, 5 de setembro de 2015

“Se você me engana uma vez, a vergonha é sua, se você me engana duas vezes a vergonha é minha!” - O FMI e os Salários na Função Pública em Angola.

Nos últimos dias foram divulgadas, especialmente através das redes sociais, várias reacções contra a sugestão deixada pelo FMI a quando da última visita ao abrigo do Artigo IV. Neste post vamos brevemente rever o que de facto sugeriu o FMI e as razões das reacções verificadas.

O FMI no seu comunicado de imprensa verdadeiramente sugeriu que seria “fundamental alinhar melhor a massa salarial no sector público, em percentagem do PIB, com a nova realidade de receita orçamental” [nosso ênfase]. Dai dizermos que o FMI está a sugerir uma redução no salário [por si só já magro] da função pública é um outro exercício. Mas então a que se deveu as reacções que vimos nas redes sociais?

Em nosso entender tal reacção poderia encontrar respaldo no que a teoria económica chama de Rational Expectations Theory [traduzindo: teoria das expectativas racionais]. Ela nos sugere que os agentes económicos tomam decisões baseando-se nas informações disponíveis e nas experiências passadas.

Se olharmos para o que aconteceu com o aumento do preço dos combustíveis notamos que o que o FMI havia sugerido, numa visita idêntica, foi o aumento gradual do preço bem como sugeriu um preço máximo de 115 Kwanzas. Todos nós sabemos qual foi a realidade material. Tivemos uma subida brusca dos preços e tal aumento ultrapassou o que havia sido inicialmente recomendado!

Analisado o problema desta forma podemos ver que quem está nervoso hoje até tem alguma razão de estar uma vez que tendo em conta a experiência passada, a luz do que nos ensina a teoria das expectativas racionais, espera-se que o governo aproveite essa recomendação para fazer o mesmo que fez com o preço dos combustíveis mesmo que não haja indício de momento. Afinal como diz um ditado Chinês “se você me engana uma vez, a vergonha é sua, se você me engana duas vezes a vergonha é minha!”

 

P.S.: No nosso post de 21 de Maio de 2014 argumentamos que um bom salário contribuía significativamente para o aumento de produtividade dos trabalhadores. Reduzir o salário em nosso entender originaria um processo inverso bem como poderia causar uma certa instabilidade social, algo que poderia minar o não tão confortável ambiente de negócios do país. Poderíamos considerar reduzir o número de administrações comunais/municipais existentes, reduzir o número de vice-governadores, ministérios e secretários de estado. Mas como sabemos que tal redução não seria politicamente viável ficamos pela sugestão da aplicação do método de gestão por objectivos. Quem não fosse capaz de atingir as metas definidas poderia ver o seu posto de trabalho extinto. Afinal é na crise que emergem os grandes líderes e gestores.