Hoje parece ser consenso que Africa precisa empreender uma transformação estrutural se quiser
atingir um alto nível de desenvolvimento de forma sustentável. Isso se deve ao facto de que o
fantástico crescimento económico recentemente verificado no continente ter
estado ligado a alta de preços das matérias-primas nos mercados internacionais.
Esta realidade tem feito com que as economias africanas sejam susceptíveis a
choques externos, como é o caso de Angola com o petróleo.
Sobre
a necessidade que África tem de se desenvolver, Julius Nyerere, antigo
presidente da Tanzânia, dizia que “África
precisa de correr, enquanto outros caminham”. Todavia, hoje quando se fala de África precisamos ter em conta
que nesta fase os países africanos ‘correm’ a diferentes velocidades. Por exemplo a Etiópia, país onde
investidores privados chineses estão a dinamizar os parques industriais locais,
regista uma previsão de crescimento real do PIB de 8.5% em 2017 e 2018[1],
ao passo que o Executivo em Angola prepara uma revisão em baixa do crescimento,
segundo o Expansão passará de 4,9%
para 2,4%. Esta nova previsão está alinhada com o relatório Perspectivas Económicas em África 2018 do Banco Africano de
Desenvolvimento. Apesar de ser uma perspectiva positiva não deixa de ser preocupante se tivermos em conta o crescimento
anual da população, o número crescente de jovens licenciados que todos os anos
procuram, sem sucesso, entrar no mercado de trabalho e já agora o número de
desempregados que o futuro processo de redimensionamento do sector empresarial
público vai gerar. O Executivo tem sido incapaz
de estimular aqueles sectores da economia susceptíveis de produzirem efeitos
multiplicativos.
As nossas pesquisas
indicam que hoje muitos jovens Etíopes encontram emprego na indústria de
confecções fruto do investimento privado chinês. O surgimento da indústria
têxtil na Etiópia foi possível devido a produção local de 120.000 toneladas de
algodão/ano e do fornecimento, nos parques industriais de referência como o de
Hawassa, de energia eléctrica à baixo custo. Estamos em presença de uma
interligação sectorial desejada i.e. aumento de produtividade no sector agrário
atraiu investimentos industriais com o potencial de alavancar as exportações
trazendo divisas para a economia. De facto, dados do Governo Etíope[2]
indicam que desde 1992 foram aprovados 65 projectos no sector têxtil que
registou um crescimento de 51% nos últimos 6 anos. Hoje a Etiópia recebe
encomendas de grandes retalhistas mundiais como a TESCO, Walmart e a H&M.
Como se pode ver na Etiópia pode estar acontecer o que faltou no plano de
reabilitação da indústria têxtil em Angola[3]
i.e. interligação sectorial e geração de um número maior de empregos.
Para atingir estes dois objectivos indicamos, num outro texto[4],
que as políticas de desenvolvimento do Executivo devem ser pragmáticas i.e. capazes de produzirem os resultados desejados. O
Executivo precisa de recuperar, por exemplo, o sentido pragmático que norteou o
desenvolvimento do sector petrolífero no período pós-independência. A história
regista, por exemplo, a presença de tropas internacionalistas Cubanas a
protegerem interesses económicos de capitalistas norte-americanos e estes
pagavam por isso! Este tipo de pragmatismo verificou-se nos países asiáticos
que mais se desenvolveram nos últimos 30 anos e verificasse igualmente na Etiópia
um dos países africanos com a maior taxa de crescimento real do PIB.
Em Angola a actividade industrial chinesa fruto do investimento
privado estrangeiro está concentrada na indústria de materiais de construção[5].
Contudo, os investidores chineses pela sua experiência, poderiam contribuir
para o desenvolvimento de outros segmentos da indústria transformadora caso
houvesse incentivo à produção local de matérias-primas para depois serem
transformadas. Analisando o caso concreto da indústria têxtil angolana, na
ausência da produção de algodão, o investimento chinês no sector de vestuários
parece limitado a importação de ‘balões’
de fardo (i.e. roupa usada) vendido a compradores ávidos no novo
empreendimento baptizado de ‘Cidade da China’ e ironicamente instalado no pólo industrial de Viana (foto abaixo). Apesar deste tipo de
investimento gerar empregos, é preciso notar a sua insustentabilidade
especialmente numa altura em que Angola debatesse com a falta de divisas.
Todavia, não deixa de ser assinalável que o Executivo angolano não criou as condições necessárias para
que outros investimentos privados, de angolanos ou estrangeiros, de melhor qualidade surgissem, como foi o
caso dos chineses na Etiópia.
Foto crédito: Autor
De facto, uma recente avaliação feita ao Plano Intercalar indica que das 144 medidas para saída da crise, apenas
foram completadas 37. Isto significa
que o Executivo não foi capaz, como
já prevíamos[6],
de executar o seu próprio plano. A aceleração do crescimento em Angola passa
pelo aumento da produtividade no sector agrícola, i.e., rentabilizar melhor os perímetros irrigados existentes,
garantir o fornecimento de fertilizantes e infra-estrutura básica, mecanizar a
produção, assegurar suporte em pesquisa e desenvolvimento de sementes
melhoradas. Estas medidas exigem que o Executivo melhore
a qualidade das suas intervenções. Pelo que, é imperioso que o Chefe do Executivo compreenda que o sucesso de
Angola não pode estar dependente da
flutuação ascendente do preço do petróleo nos mercados internacionais mas sim,
de objectivos realistas e atingíveis no espaço de tempo definido.
Enfim, se por um lado alguns países africanos, como a Etiópia, parecem
estar a ‘correr’ na direcção certa, entrando mesmo em novos sectores mais
globalizados onde as exigências organizativas e de coordenação da cadeia de
valor são muito importantes, numa altura em que o Presidente João Lourenço mostra
vontade de levar acabo o processo de diversificação da economia, ao Executivo
angolano, à luz dos resultados acima apresentados, apenas resta encetar um sprint para tentar recuperar o tempo
perdido!
*Uma versão foi publicada inicialmente no Jornal Expansão Edição 468, 13
Abril, pág. 37.
[4] Wanda, F. (2018) ‘Não importa a cor do gato, o que importa é se ele sabe
caçar ratos! Expansão, Edição 460, 16 Fevereiro.
[5] Wanda, F. (2017) ‘Angola e China: Nem
tudo é o que parece ser!’ Expansão, Edição 452, 15 Dezembro.
Sem comentários:
Enviar um comentário