Neste espaço
indicamos que o Executivo em Angola precisava fazer um sprint[1]
para tentar recuperar o tempo perdido. Todavia, é importante relembrar que tal
não significa que se deva saltar etapas. Na recente reunião da Comissão
Económica do Conselho de Ministros abordou-se, dentre outros aspectos, o
processo de graduação de Angola, pelas Nações Unidas, de país de rendimento
baixo para país de rendimento médio. Apesar de estarmos conscientes que este
processo representaria um enorme ganho político para o Executivo é imperioso
não se esquecer que uma graduação prematura e insustentável poderia acarretar
consequências sérias para o desenvolvimento harmonioso de Angola.
Existem
benefícios atribuídos aos países de rendimento baixo como Angola[2], por exemplo, ao nível do acesso ao
crédito concessional, i.e. com condições de reembolso mais favorável, cedido
por instituições financeiras internacionais. Nesta fase em que o Executivo
angolano parece apostado em fomentar as exportações não petrolíferas, podemos avançar
aqui a possibilidade que a União Europeia dá aos países de rendimento baixo de
exportarem, com isenções, para a zona Euro tudo excepto armas. Angola perderá
este beneficio tão logo passe para país de média renda. Como país de renda
baixa Angola faz parte do conjunto de países com a possibilidade de aceder ao mercado
Norte-Americano em condições bastantes favoráveis, no âmbito do projecto AGOA –
Africa Growth Opportunity Act. Apesar
destes dois programas representarem uma excelente oportunidade para Angola
dinamizar as suas exportações fora do petróleo, a verdade é que ao longo desses
16 anos de paz o Executivo não foi capaz de articular uma estratégia
sustentável que permitisse o país tirar alguma vantagem.
A recente
apresentação dos resultados do Inquérito de Indicadores Múltiplos e de Saúde
(IIMS 2015-2016) pelo Instituto Nacional de Estatística (INE)[3] deveria
servir para o Executivo angolano consciencializar-se de que Angola é
verdadeiramente, ainda, um País de baixo rendimento2.
Todavia, é importante esclarecer o que se quis dizer com o facto de parte da
população (48%) em Angola vive em “pobreza multidimensional” conforme veiculado
por um jornal. Hoje nos estudos sobre a pobreza extrema recomendasse a não utilizar
como indicador principal o rendimento do indivíduo (ou do agregado familiar),
ao invés adoptar-se vários indicadores, resultando numa visão multidimensional
da pobreza. Isso porque os pesquisadores notaram que adoptando o rendimento
como indicador principal, i.e. dizer que o indivíduo que vive com um valor inferior
à 1 ou 2 dólares por dia i.e. está abaixo da linha da pobreza extrema, faz crer
que quem tiver um rendimento superior a este valor está fora dessa condição. Daí
a recomendação de olhar-se também para outros indicadores como acesso a água
potável, mortalidade infantil, nutrição, ano de escolaridade, saneamento e
medirmos o status da privação.
Dos resultados
principais deste inquérito salta a vista o facto de 3 em cada 10 agregados
familiares não terem instalações sanitárias (WCs) apropriadas. O que pode
explicar a falta de sanidade do meio e as consequências para saúde pública.
Notamos com bastante interesse que 82% de agregados familiares rurais possuem
terra para agricultura. Pensamos que aqui é possível o Executivo desenvolver programas
de ajuda a essas famílias por formas a tornarem mais produtivas essas terras.
Tal ajuda iria contribuir para se reduzir a malnutrição crónica nos agregados
familiares, um mal que afecta 38% das crianças menores de 5 anos em Angola.
Não deixa de ser
preocupante notar que Angola apresenta uma alta taxa de fecundidade (6,2 filhos
por mulher), o que pressupõe a necessidade de rapidamente se implementar uma
política de controlo do crescimento da população. Isso para que se possa
atender as necessidades presentes e futuras da população. A idade mediana da 1ª
relação sexual (16,6 anos para as Mulheres e 16,7 Homens) e do 1º parto 19,5
(i.e. 3 anos depois da 1ª relação sexual) ilustram essa necessidade.
Acreditamos que aos 16 anos um jovem adolescente em Angola não tenha acesso a
toda a informação necessária para ter um sexo seguro, o que pode facilitar o
risco da propagação de doenças sexualmente transmissíveis.
Enfim,
se por um lado compreendemos que uma graduação de Angola de país de baixa renda
para média daria ao Executivo chefiado pelo Presidente João Lourenço uma certa
credibilidade e segurança, porém intentar tal graduação sem (1) tirar o máximo
de proveito da condição de país de baixa renda e (2) melhorar os principais
resultados apresentados no mais recente Inquérito de Indicadores
Múltiplos e de Saúde, seria, em nosso entender desastroso. Pelo que,
continuamos a defender que o Executivo deve tratar de fazer bem as coisas
básicas i.e. alavancar o sector produtivo, e tudo o resto, graduação e possível
entrada para o grupo de países emergentes, vai depois se encaixar. Afinal, a
natureza não salta
etapas!
*Publicado
inicialmente como: Wanda,
F. (2018) ‘A Natureza Não Salta Etapas!’ Expansão, Edição 486,
17 Ag. http://www.expansao.co.ao/artigo/100080/a-natureza-nao-salta-etapas-?seccao=7
[1] Wanda, F. (2018) ‘África precisa de
‘correr’, já o Executivo em Angola tem que encetar um sprint!
Expansão, Edição 468, 13 Abril.
[3] Numa parceria com o
Ministério da Saúde (MINSA) e o Ministério do Planeamento e do Desenvolvimento
Territorial (MPDT).
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