segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

Ineficiências em projectos de investimentos públicos (PIP)

Ao ler o Relatório de Fundamentação do OGE 2015 fiquei chocado ao notar que actualmente é possível incluir projectos de investimentos públicos (PIP) no OGE sem sabermos o preço efectivo e o respectivo cronograma de execução física! Agora já é possível perceber por que razão na cidade de Luanda existem algumas infra-estruturas enquadradas no PIP em execução a vários anos sem que se saiba a sua possível data de conclusão. Como exemplo temos a estrada que sai do Camama em direcção a Vila Estoril -Golfe II). Esta via deixou de ser mexida em Dezembro de 2013 e até hoje não sabemos quando é que eventualmente venha a estar concluída. E quem é que paga por essa ineficiência?

 Num estudo recente sobre a construção de infra-estruturas num ambiente regulado, Zaakirah Ismail et al. (2014) olhando para o contexto Sul-africano sugere que o custo resultante da má informação sobre o preço efectivo de um projecto de infra-estrutura pública acaba sendo repassado para os usuários directa ou indirectamente. No caso de Luanda o exemplo da estrada do Camama – Golf 2 resulta na redução da qualidade de vida de todos aqueles que são forçados a fazer uso daquela via, bem como nos custos que advêm dos danos que muitas das viaturas sofrem ao trafegarem naquela via.

Em suma: É imperioso garantir que o PIP em geral (e em particular aqueles ligados a infra-estruturas) contribua para o crescimento económico e aumento da qualidade de vida do cidadão normal. Contudo, isso só poderá ser possível se forem eliminadas muitas das actuais ineficiências para que não sejamos nós usuários a pagar por isso.

sexta-feira, 7 de novembro de 2014

Os Caminhos da Transformação Estrutural em Angola: Agricultura (2)

Na nossa reflexão anterior frisamos que o sector industrial em Angola em muito poderia beneficiar caso o sector agrícola registasse um aumento de produtividade significativo. Neste post, nós vamos aproveitar um caso real para de uma forma simples ilustrarmos como o estado poderia criar um cluster agro-industrial com serviços complementares.

Ficamos a saber através de uma notícia divulgada num jornal privado que alguns agricultores na província de Benguela (localidade do Dombe Grande) reclamam por uma intervenção do estado uma vez que parte significativa da sua produção de tomate está a se deteriorar devido a dificuldades no processo de escoamento dos produtos. Bem, parece que os agricultores em Benguela já estão a fazer a sua quota parte no que deveria ser o processo de (re)industrialização de Angola.

Essa notícia por si só deveria servir de uma oportunidade para o estado angolano mostrar ao país que está verdadeiramente comprometido com o processo de diversificação da economia. Para tal algumas medidas poderiam ser tomadas, fazendo uso dos já existentes programas de apoio ao fomento empresarial (ex: Angola Investe). Para tal, pensamos nós que o estado, enquanto coordenador da actividade económica deveria mesmo desafiar os empreendedores nacionais a apresentarem projectos que pudessem dar cobro a esse problema real.

Em nosso entender os agentes privados poderiam propor projectos como: a instalação de unidades fabris de transformação de tomate que mais tarde poderiam servir para abastecer o mercado nacional e até para exportação ou investimento numa rede de distribuição deste produto. Vale realçar que todos esses projectos poderiam ser feitos de forma isolada por vários agentes privados, para permitir a especialização dos mesmos, mas de forma coordenada e interligada reduzindo desperdícios uma vez que este tipo de iniciativa exigiria avultados recursos financeiros e know-how em vários domínios.

Por outro lado, um projecto desta magnitude iria necessariamente gerar a necessidade de serviços complementares, criando oportunidades para os prestadores de serviços já existentes no mercado e/ou até o surgimento de outros prestadores de serviços mais especializados para o sector em causa (serviços virados para os agricultores e para os industriais).

Como se pode compreender do que já foi acima exposto, o papel do estado neste tipo de projecto, em nosso entender, deixa de ser o de “Super estado faz tudo e passa a ser o de criador das condições necessárias através de, por exemplo, da construção de infra-estruturas como estradas, disponibilização de terrenos com acesso a água e electricidade, para que tais investimentos fossem viáveis e gerassem benefícios aos proponentes, a comunidade local através de empregos directos e indirectos e ao próprio estado através dos impostos (ex.: industrial, IRT).

Em suma, com este tipo de intervenção deixaríamos de ver os nossos agricultores a reclamarem por uma intervenção directa do estado e como resultado de uma problema real e actual estaríamos a criar um cluster agro-industrial na região do Dombe Grande. Assim se faz/promove a tão desejada transformação estrutural da economia do país.

quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Os Caminhos da Transformação Estrutural em Angola: Agricultura (1)

Um dos conceitos mais usado no âmbito do que se entende hoje por desenvolvimento economico é o que se entende por transformação estrutural. Por transformação estrutural entenda-se grosso modo um processo que ocorre numa economia dualista com dois sectores indústria vs agricultura, onde o sector industrial é visto como um sector mis productivo e o agrícola como o menos. Assim sendo, neste contexto o desenvolvimento económico ocorre quando a força de trabalho (e a alocação de recursos) saí do sector de actividade menos productivo (i.e. da agricultura) e vai para o de maior productividade (i.e. indústria).

Existem vários problemas com este tipo de visão dualista. Vamos nesta breve reflexão abordar algumas das implicações.

Nesta visão subentende-se que o sector agrícola é menos productivo que o sector industrial e como tal a ele deve ser dada menos atenção. Todavia, se olharmos para a história do desenvolvimento dos agora países desenvolvidos podemos ver que o desenvolvimento industrial só foi possível graças a um aumento de productividade no sector agrícola. Isso significa que países como o Reino Unido, EUA, Alemanha, rercentemente o Japão, Coreia do Sul, Taiwan conseguiram se desenvolver industrialmente porque o sector agrário nesses países conseguiu atingir niveis altos de productividade. Em suma, podemos afirmar que sem uma agricultura desenvolvida e bastante productiva estes países (citados) não seriam capazes de criar uma indústria forte. Apresentado desta forma o papel do sector agrícola no desenvolvimento industrial dos agora países desenvolvidos não pode ser negligenciado.

Para o caso de Angola fala-se muito da necessidade de se diversificar a economia, especialmente numa altura em que o preço do petróleo bruto nos mercados internacionais parece estar em queda. Contudo, pouco se fala das medidas a serem adoptadas para que possamos começar a aumentar a productividade do nosso sector agrícola. Fala-se da necessidade do país se (re)industrializar mas parece que queremos ser o único país a fazer isso sem agricultura! Em suma: não é possível falar-se em transformação estrutural em Angola pensando apenas na movimentação de recursos de um sector menos productivo (i.e. agricultura) para outro de maior productividade. Para o caso de Angola e tendo em conta a história do desenvolvimento em outros paises, é importante percebermos que a nossa transformação estrutural terá que passar necessariamente pelo aumento da productividade no sector agrícola e a partir daí termos as bases para uma rápida (re)industrialização.

domingo, 28 de setembro de 2014

Investimento Directo Estrangeiro em Angola versus Investimento Angolano no Estrangeiro



Segundo o website de notícias Macauhub.com Angola é o ÚNICO país africano cujo investimento no estrangeiro foi superior ao volume de Investimento Directo Estrangeiro recebido em 2013. Isso significa que em 2013 os Angolanos preferiram investir mais no estrangeiro do que no seu próprio país. Apesar de muitos poderem achar que isso talvez seja um sinal da grande capacidade financeira de Angola (muito aludida nos últimos anos), vale reflectirmos sobre o seguinte:

1. Será que existe uma falta de confiança dos angolanos com certo poder financeiro de poderem ter um maior retorno caso façam os seus investimentos no país?

2. Em que sectores os angolanos mais investiram no estrangeiro (a notícia faz menção do caso dos investimentos da Sonangol no sector petrolífero de Portugal, Brasil, São Tomé e Cabo-Verde, bem como de investimentos privados no sector bancário português e investimentos na mídia portuguesa através da aquisição de alguns periódicos).

Como de pode ver muitos dos investimentos feitos no estrangeiro foram direccionados para o sector de serviços e não para o sector produtivo. De qualquer forma, a verdade é que se por um lado existem angolanos interessados em investir e encontram no estrangeiro essa possibilidade, por outro lado existe internamente uma demanda por investimento no sector produtivo. A questão chave seria: Como reconciliar estes dois interesses?

Se analisarmos o que acontece em alguns países asiáticos como o caso mais recente da Coreia do Sul e Taiwan, vemos que nesses países as elites reinvestem no país mais de 70% dos seus ganhos. Isso é possível porque lá o ESTADO direcciona o investimento. Fazendo uma comparação com o caso de Angola, podemos facilmente notar que esse não parece ser o nosso caso. Se assim for vale questionar o que é que faz com que alguns angolanos prefiram investir fora do país ao invés de, por exemplo, investirem no sector produtivo do país? O que é que facilita essa saída de capital, em forma de investimento angolano no estrangeiro, quando o país mais precisa desse capital? O que se poderá fazer para se desencorajar a saída de capital e aumentar o investimento privado nacional no sector produtivo nacional (afinal o governo está a investir nas infra-estruturas)?

A luz do que foi acima exposto, parece correcto dizermos que Angola TALVEZ não necessita tanto de investimento directo estrangeiro, como muitas vozes nos fazem crer, mas sim de adoptar políticas que possam:
  • Incentivar aqueles angolanos com capital a investirem MAIS no país, em geral, e em particular no sector produtivo do país e com isso contribuírem para a criação de mais empregos (para a juventude em especial).

Mas para se materializar esse propósito é imperioso começarmos a pensar mais no país que gostaríamos de ter num futuro próximo afinal se não formos nós, o capital estrangeiro muito pouco vai fazer para tornar esse sonho nosso em realidade.

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Angola e a Zona de Comércio Livre da SADC (1)

Se existe um tema que muita controversia tem causado é com certeza o tema sobre a liberalização ou não das fronteiras, i.e. a permissão de livre circulação de mercadorias. Vale abrir aqui um parentesis para dizer que por norma o foco tem mesmo sido na livre circulação de mercadorias uma vez que a livre circulação de pessoas e ideias trás consigo outras implicações.

Mas o por quê tanta gente está a favor e outros tantos contra e o que se pode fazer com tudo isso? Pois bem vamos reflectir sobre o assunto de uma forma breve, mas objectiva.

Os proponentes de uma zona de comércio livre (seja ela qual for) baseiam as suas posições na teoria da vantagem comparativa proposta por David Ricardo, segundo a qual os países beneficiam-se mutuamente quando se especializam na produção de produtos que lhes garantam certa vantagem comparativa (isto é productos produzidos a um custo de produção mais baixo que os seus parceiros). Os benefícios, segundo os defensores desta medida, surgem porque tal medida aumenta a concorência no mercado (agora livre de ‘obstáculos’) e nele apenas sobrevivem os que conseguem produzir com melhor qualidade e claro com mais eficiência (redução de custos). Como evidência tem-se indicado o caso europeu onde todos os paises parecem estar a beneficiar da zona de livre mercado. Dizemos “parecem” porque a crise economica acabou por mostrar quem foram os grandes ganhadores e perdedores no contexto europeu.

Falando concretamente da SADC existe um estudo de Emilio Dava (2012) que sugere que a liberalização do comércio na zona da SADC (ele analisou 7 países dessa zona a saber: Africa do Sul, Botswana, Ilhas Maurícias, Madagascar, Moçambique, Tanzânia e Zâmbia) parece trazer crescimento económico. Apresentado desta forma, podemos argumentar que a integração numa zona de comércio livre na região da SADC deveria trazer para Angola inumeros beneficios.

Os opositores de tal medida sugerem muitas vezes que uma rápida adesão à zona de comércio livre no actual estágio de desenvolvimento de Angola poderia influenciar negativamente o crescimento sustentável da nossa indústria nascente uma vez que elas estariam em desvantagem concorrencial perante empresas com mais experiência. Para sustentar essa posição podemo-nos socorrer de trabalhos de autores como Alexander Hamilton (politico norte-americano), G. Friedrich List (economista alemão) e recentemente autores como Alice Amsden ou Ha-Joo Chang que argumentam que não existe nenhum país, dos agora países ricos, que tenha chegado a este estágio graças ao comércio livre (ou através da simples aplicação de politicas de boa governação, combate a corrupção dentre outras medidas defendidas hoje por organizações internacionais como o Banco Mundial e o FMI). Todos eles tiveram que aplicar medidas protecionistas na fase inicial do seu desenvolvimento e apenas muito mais tarde (quando já estavam num estágio mais avançado) adoptaram uma posição mais liberal. Afinal, o comércio entre dois países só é mutuamente benéfico se ambos estiverem num mesmo estágio de desenvolvimento. De contrário, um deles poderá tirar maior vantagem dessa integração (podemos aqui mencionar o caso do México com a NAFTA).

Em suma: A liberalização de comércio entre dois paises (ou mais) gera benefícios mútuos quando os mesmos se encontram em igual estágio de desenvolvimento, de contrário ganha mais o que estiver mais desenvolvido.

terça-feira, 29 de julho de 2014

O desenvolvimento Chinês e oportunidade para a criação de uma indústria manufactureira africana.

Justin Lin, ex-Economista Chefe do Banco Mundial e actualmente professor de economia na Universidade de Peking (que por sinal já tive o prazer de ouvi-lo numa apresentação sobre transformação estructural) é citado pela Bloomberg (22/07/2014) como tendo sugerido que na China cerca de 80 milhões de empregos no sector da indústria manufatureira poderão ser exportados para outros paises e avança mesmo que os paises africanos poderiam tirar aproveito dessa oportunidade.

Ok parece ser uma idéia interessante, mas será que isso é algo que os paises africanos gostariam mesmo de aproveitar? Se sim, o que poderão estes paises fazer para serem os beneficiados?

Vamos lá primeiro tratar de perceber por que razão a China está a “exportar” esses empregos. Uma resposta simple é devido ao aumento de salarios na China. Sim, os chineses já deram conta que em períodos de crise depender excessivamente das exportações é prejudicial, logo, a política agora é criar um mercado de consumo interno. Sendo esta a principal razão, uma vez que em termos de infraestructuras a grande maioria dos paises africanos têm sérios problemas e necessita de avultados investimentos a curto, médio e longo prazo (para os mais atentos essa necessidade foi uma das razões evocadas pelos BRICS a quando da recente criação do seu banco de desenvolvimento), os paises que desejarem atrair para si tais empresas deverão ser capazes de garantir BAIXOS salarios para as suas populações.

Então, será que isso significa que paises como Angola onde os trabalhadores lutam para verem melhoradas as suas condições sociais através, por exemplo, de um salario mais justo (e que realmente chegue até ao final do mês), estão impossibilitados de beneficiarem dessa grande oportunidade?

Sabendo que 37% da nossa população está a viver com menos de 4.793 Akz mês (cf. IBEP, 2009) adoptar uma política que procura manter barata a mão de obra por si só parece, em nosso entender, a menos apropriada. Afinal, depois de quase 30 anos de guerra é justo que o povo deseje, agora, gozar um pouco dos benefícios da paz através de um salário condigno. Contudo, em jeito de meio termo, poder-se-ia adoptar outras medidas que servissem de incentivo as empresas estrangeiras (neste caso empresas chinesas, mas poderiamos estender tais medidas a outras) que quisessem deslocar as suas operações para Angola. Conforme indiquei no post anterior,  24 de Julho, 2013,  e que volto aqui a mencionar, o governo poderia: garantir a população acesso a uma assistência médica básica com alguma qualidade, educação, habitação e a um sistema de transporte público condigno, através de uma boa aplicação das receitas provenientes do petróleo e de outros minerais.

Outras medidas que também já foram sugeridas (ver post de 9 de Agosto de 2013) têm haver com a criação de Zonas Economicas Especiais (ZEE) que no  caso de Angola já é um projecto em curso mas que está a precisar de reajustes conforme mencionei no post de 10 de Julho 2014. Nessas zonas as empresas estrangeiras poderiam desenvolver as suas actividades com um custo operacional mais aceitável.

Vale recordar que alguns paises asiáticos como o Vietname e Mianmar já estão a receber algumas dessas empresas (devido aos baixos salarios). Em África parece que apenas temos o caso da Etiopia que sendo o segundo país mais populoso a sul do Saara parece estar a tirar proveito deste factor. Paises como Angola que pelas razões já assinaladas não poderiam competir com salários baixos podem sim, uma vez criadas às condições acima mencionadas, tratar de divulga-las da forma mais eficaz e eficiente possível para tirarem também proveito desta soberana oportunidade.

segunda-feira, 28 de julho de 2014

“O governo vai criar 1 milhão de empregos”

Fonte: Angop http://www.portalangop.co.ao/angola/pt_pt/noticias/politica/2014/6/30/Angola-Governo-cria-mais-milhao-emprego-ate-2017-Ministro-Chikoti,bed85c73-fb59-4514-b9fc-efd01b765278.html


E lá vamos nós de novo. Apresentar desafios/projectos gigantescos parece ser rotina nos dias de hoje. Antes foi“1 milhão de casas” que depois notou-se ser uma missão impossível no tempo dado. Parece que não aprendemos e voltamos agora a falar em 1 milhão de empregos até 2017! Ok, vamos lá dissecar isso: Será que já conseguimos dizer quantos empregos o país está a ser capaz de criar por ano? Em que sectores serão criados esses empregos? Que tipo de emprego será criado? Estes empregos vão ajudar a reduzir o desemprego no país em quantos porcentos? Já agora, saibam que é difícil obter dados sobre a taxa de desemprego em Angola.

Algum tempo atrás (ver post de 24 de Julho, 2013) expliquei neste fórum (e em algumas conferências internacionais) que criar emprego por criar, no caso relacionado com a desregulação do mercado do trabalho, através da flexibilização da Lei Geral do Trabalho em Angola, não ajudaria muito a população angolana no geral e em particular a juventude e nem tao pouco criaria a tão desejada estabilidade no emprego. Precisávamos identificar o tipo de empregos a criar, uma vez que poderíamos estar a criar empregos precários, isto é, empregos que não oferecessem nenhuma estabilidade laboral e muito menos garantia de melhoria das condições sociais dos potenciais beneficiários.

Sim, o executivo até poderia ficar pelos 100,000 empregos, dar-nos-íamos por satisfeitos, desde que fossem sustentáveis a longo prazo e que proporcionassem condições sociais condignas aos beneficiários.

quinta-feira, 10 de julho de 2014

“A agricultura é a base e a indústria o factor decisivo”


Alguns de nós crescemos a ouvir o slogan “A agricultura é a base e a indústria o factor decisivo”. Tendo sido recentemente realizada a cimeira de chefes de estado / governo africanos em que este assunto foi um dos temas principais, urge reflectirmos um pouco sobre o mesmo tendo como pano de fundo a nossa realidade angolana.

Começamos por relembrar o que nos disse uma vez Jonathan Di John (Professor na SOAS, Universidade de Londres) que a história do desenvolvimento dos agora países desenvolvidos nos ensina que os mesmos atingiram este estágio por duas vias: 1º houve um aumento da productividade agrícola – uma espécie de revolução agrária, e 2º desenvolveram a indústria transformadora. Caso ainda haja dúvidas podemos citar o caso mais recente dos países asiáticos em que destacamos a Coreia do Sul e Taiwan, China e mais recentemente o Vietname (como exemplo de país que nos dias de hoje está a enveredar pelo mesmo caminho).

A luz desses exemplos urge perguntar “Porque razão, passados mais de 10 anos de paz a nossa luz no fundo do túnel parece um tanto quanto pálida?” Tentei buscar possíveis respostas para justificar a nossa letargia, a saber: 1º tivemos e ainda estamos a resolver os problemas das minas terrestre fruto do longo conflito armado; 2º estamos a criar infraestruturas de apoio como estradas, pontes e canais de irrigação; 3º já criamos alguns institutos agrários – para termos os nossos recursos humanos devidamente qualificados. No que toca a indústria estamos a criar as Zonas Económicas Especiais (ZEE).

Apesar de ter conseguido arranjar “desculpas”, pessoalmente não estou de todo convencido que se tudo isso estiver arrumado, a situação vai ser diferente pelo seguinte: Não existe um relatório actualizado que nos possa informar o que está sendo feito com os terrenos já desminados. Sei que Angola utiliza apenas 5,7% dos hectares disponíveis (de um total que acredito incluir os que ainda estejam minados, ver o meu post de 21 de Julho de 2013 neste blog). No que toca a infraestruturas, a grande questão que se têm colocado é a qualidade das mesmas (e a sua durabilidade), o que deixa-nos algumas reservas se tivermos em conta o custo VS benefício dessas obras. Estamos todos conscientes da ausência de um plano bem estruturado com vista a garantir aos recém-formados (nos institutos criados) uma rápida inserção no mercado de trabalho. Por último tomamos conhecimento, recentemente, que a administração de ZEE (Luanda-Bengo) estava a procurar atrair parceiros (investidores nacionais e estrangeiros) para os detentores de espaços (i.e. terrenos) naquela área. Apesar de uma notícia bastante interessante, não deixamos de ficar incrédulos uma vez que sabiamos que as pessoas interessadas só poderiam ter acesso a esses terrenos (que serão infraestruturados) caso tivessem UM PROJECTO INDUSTRIAL.

Como se pode compreender desta constatação, para que o nosso grande slogan “A agricultura é a base e a indústria o factor decisivo” tome corpo vai ser preciso algo mais do que remover minas terrestre, construir pontes e dar formação. Vamos ter que mudar de mentalidade, sair da chamada mentalidade “rent-seeking” (i.e. busca de rendimento fácil e/ou facilitado) para uma mais produtiva e empreendedora dando acesso a recursos e bens, a quem deles venha realmente a fazer uso multiplicador (gerando empregos, riqueza e pagando impostos).

quarta-feira, 21 de maio de 2014

Cadê o dinheiro Chinês?


Após a visita do novo Primeiro Ministro Chinês a Angola ficou-se a saber, através do Jornal Expansão, que o empréstimo Chinês ao Governo de Angola já está a volta dos 8 mil milhões de doláres.

Após uma pesquisa sobre este assunto apenas encontramos explicações sobre os primeiros 4.5 mil milhões disponibilizados em 2004. O website do Ministério das Finanças nos mostra num documento de 2007 (por isso já desactualizado) como foi aplicado o empréstimo feito pelo EXIM Bank da China, bem como nos dá uma breve informação sobre o CIF (China International Fund).

Vale recordar que a quando desse primeiro empréstimo houve um grande alarido por parte da comunidade internacional, especialmente pelo facto de se achar que o governo angolano tinha/tem pouca apetência para, de uma forma transparente, informar como estava a utilizar tal recurso. Notamos que existem várias publicações sobre o assunto (incluindo teses de mestrado e doutoramento), mas que tudo parece indicar que os primeiros 4.5 mil milhões foram gastos de uma forma tão transparente (quanto possível), conforme assinalamos em Wanda (2013).

Num artigo de pesquisa nosso, indicamos que 31.6% deste valor foi gasto no sector social (educação, saúde, electricidade e água). 48.5% desse valor foi aplicado no processo de (re)construção de infraestructura básica.

Contudo, e atendendo que o valor já está em 8 mil milhões faz sentido, enquanto académicos e investigadores científicos, indagarmos em que sector está sendo aplicado os 3.5 mil milhões adicionais!

Pros & Cons do Aumento Salarial na Função Publica em Angola

[fonte: Jornal de Angola 8 Maio, 2014]

Apos ter lido algum tempo atrás que o Governo de Angola decidiu aumentar em 13% o salário mínimo nancional, acabo de ler outra notícia segundo a qual os Suíços, após um referendum, recusaram ter a possibilidade de ostentarem o maior salário mínimo mundial (que no caso seria de 14.01 USD por hora de trabalho). A questão da necessidade de existir ou não um salário mínimo nacional (devidamente estabelecido) parece ter voltado ao top da agenda politica em vários países desenvolvidos como a Alemanha, EUA, França e Reino Unido[1] especialmente neste período de austeridade.

Para o caso específico de Angola, podemos mesmo afirmar que esse ajuste já vem tarde, uma vez que é possível verificar, nos mais variados supermercados existentes em Luanda (com particular realce para os da rede Nosso Super), que os productos considerados da cesta básica estão a um preço muito acima do salário mínimo nacional. Isso significava que quem recebe tal salário não está em condições se quer de poder adquirir a cesta básica!

Um aumento do salário mínimo nacional causa sempre um mal estar à classe empresárial nacional especialmente por acharem que isso “encarece” a mão de obra nacional, tornando-a menos competitiva (na perspectiva dos investidores nacionais e estrangeiros).

Essa posição não é errada de todo, afinal o salário mínimo nacional é também usado como um indicador por qualquer investidor (nacional ou estrangeiro). Contudo, não nos podemos esquecer que um bom salário contribuiu significativamente para o aumento de productividade dos trabalhadores. Aumentando à produtividade, fica de certa forma resolvida a possibilidade de haver um aumento dos custos de produção a maior fonte de preocupação por parte de qualquer investidor no que ao aumento salarial diz respeito.

Em suma: Só vamos saber se tal medida trouxe benefícios aos trabalhadores angolanos se houver um aumento de produtividade (que na qualidade de consumidores de serviços públicos vamos poder conferir depois). De contrário, vamos assistir um aumento dos custos de produção e consequentemente um aumento generalizado de preços de bens e serviços.



[1] Ver notícia da Blomberg disponível online: http://www.bloomberg.com/news/2014-04-13/world-leading-25-hourly-wage-floor-roils-swiss-businesses-jobs.html

terça-feira, 8 de abril de 2014

“Receitas não petrofileras aumentaram 34%” mais uma evidência da resiliência do estado em Angola?


 As receitas fiscais não petrolíferas registaram um aumento na ordem dos 34%, passando de Kz 467 mil milhões em 2012 para Kz 625 mil milhões em 2013. Para este ano, a Direcção Nacional de Impostos prevê um crescimento de 42%” fonte: Jornal o País, Abril 2014.

A mobilização de recursos através da colecta de impostos representa um sério desafio a qualquer governo num país em transição (cf. Di John, 2006). Num contexto, como o angolano, onde se argumenta existir o que a literatura denomina de rent seeking e um sistema neopatrimonial onde existe igualmente a possibilidade de se obter rendas através da comercialização de recursos minerais (como diamante e petróleo), conseguir-se receitas através da colecta de impostos de outros sectores pode muito bem ser visto como uma amostra de resiliência do estado e contribui muito para a consolidação do próprio estado.

É necessário percebermos que é essencialmente por meio de impostos que o estado obtem os recursos financeiros de que necessita para levar acabo muitos dos seus programas de melhoria da condição de vida das populações e que para podermos exigir serviços sociais com alguma qualidade todos temos de contribuir com os nossos impostos (de rendimento de trabalho essencialmente). Contudo, para o caso de Angola ainda temos ouvido/lido que várias são as empresas (e pessoas individuais) que não pagam os seus respectivos impostos.

Apesar de ser uma boa notícia, uma vez indicar que o governo parece estar a ser capaz de mobilizar recursos de outros sectores que não o da indústria extractiva (petróleo e minerais) e que de certa forma deita por terra muito do que nos apresenta o argumento do resources curse (maldição dos recursos minerais, cf. Collier, 2008) ficamos sem saber quais as empresas por sector não petrolífero que estão a liderar este processo.

Gostariamos, por exemplo, de saber qual tem sido o contributo, em termos de impostos, dos grandes grupos empresariais que o país hoje dispõe.  Afinal, se apesar deste aumento existir grandes empresas que ainda não estejam a pagar ao estado o que é devido dificilmente deixaremos de depender dos recursos que provem dos nossos recursos minerais que por não serem renováveis um dia se acabarão!

PS: A minha última análise (cf. Wanda, 2013) sobre a contribuição do sector não petrolífero indicava que empresas do sector de bebidas e telecomunicações em Angola estavam a ter um forte contributo como fonte de receitas para  o estado.